Friday 16 August 2019

O LAGARTO DE LÍNGUA AZUL

“O homem não pode viver para si mesmo, isolado. Devemos perceber que toda a existência é valiosa e que estamos unidos a todo um sistema de vida e, deste conhecimento realizamos nossa relação espiritual com o Universo.” Albert Schweitzer
Seguindo na mesma trajetória das últimas publicações sobre fatos da Natureza, do homem em seu contexto, da presença de outros seres que dividem nosso espaço neste planeta Terra, segue abaixo uma curiosa observação sobre o comportamento de um gracioso e inofensivo lagarto que habita grande parte do território australiano.
Nessa vasta ilha continente, em seu estado mais oeste, existe uma pequena e pacata cidade de pouco mais de 25 mil habitantes. Um paraíso de verde, fauna e flora exótica e abundante, paisagens e praias lindíssimas e cristalinas; Albany, 500 quilômetros ao sul da capital Perth. O bangalô onde vivi por mais de 3 anos, se localiza literalmente no meio do mato, perto da praia, onde fiz meu exílio e peregrinação em livros e no embalo da boa música.
Era uma completa rotina, como rotina, disciplina e razão são todos os fenômenos da Natureza ... mas, diariamente quebrada com fatos novos que vinham exatamente do ambiente que me rodeava, desse grande livro sagrado que fascina, desde o amanhecer silenciosamente anunciado pelo canto dos pássaros, ao intenso colorido do cair do sol. Se o dia era chuvoso, o brilhantismo de nossa irmã Natura não se apagava, pois os raios do sol da Vida, quando penetra entre as gotículas de chuva no ar, abriam o leque de uma das mais encantadoras exibições, a do Arco Íris intenso, do qual Albany é famosa.
E outros residentes também, nessa harmonia de seres vivos ... e em particular, uma das cobras mais venenosas e agressivas, a cobra marrom oriental, a segunda mais perigosa ... portanto qualquer aventura a pé pelas redondezas, era de intensa vigilância; aliás, na Austrália, habitam as 10 mais venenosas serpentes do planeta!
Mas nem tudo parece perigoso no mundo dos répteis!
O quintal era habitado por plantas nativas das mais distintas, mas existia um ser vegetal, que descobri mais tarde, ser alienígena no continente, produzindo uma pequena fruta amarela comestível, parecida com um minitomate ... de sabor suave e suculento. É uma variedade amarela de Physalis solanaceae - seu nome científico - sendo em português mais conhecida por tomate-de-capucho, fisális e camapu.
Numa tarde quente, concentrado em meus estudos, deixando apenas uma pequena fresta da porta de vidro aberta - por precaução de não ser surpreendido por cobras - ouvia um distinto chacoalhar, ruído de pisar suave em palha seca, que vinha do quintal. Curioso e com cuidado, me aventurei devagar para inspecionar o acontecido, quando me deparei com um gracioso lagarto, que sem se dar muita conta de minha presença, e mais concentrado em deliciar sua iguaria, de vez em quando me olhava abrindo a boca e tentando me enxotar com seu silvo, mostrando de dentro de uma boca cor de rosa, uma colorida e brilhante língua azul! O chacoalhar provinha do barulho feito para livrar a pequena fruta aprisionada em seu cálice. Na verdade, a fruta fica envolvida numa folha modificada até seu amadurecimento, que quando seca, libera parcialmente a fruta de dentro. Uma espécie de proteção natural que a irmã Natura designou para perpetuar a vida desse vegetal.
Enquanto vivia a interessante cena, meditava sobre a atitude do pequeno animal, uns 30 ou 40 centímetros de comprimento, sua pele escamosa brilhante de colorido preto, creme, marrom, a chacoalhar o revestimento seco até liberar a fruta e comê-la. Repetia seguidamente a tarefa até se satisfazer com tanta guloseima. De minha parte, enquanto eu mesmo comia algumas, eu as oferecia ao lagarto, que sem medo da proximidade de minhas mãos, abria a boca e comia. O amarelo e o azul intenso oferecem uma perfeita combinação!
De onde essa creatura aprendeu a agir dessa forma ... quantos milhares de anos foram necessários para que dominasse essa técnica de sobrevivência?
Com meu espírito ainda mais aguçado, fui procurar as origens dessa planta e um pouco da vida desse gracioso ser. E não é que para minha surpresa, descobri que essa fruta foi introduzida na Austrália, em meados do século XIX, vinda dos Andes peruanos! Portanto, foi em vão minha insipiente teoria dos milhares de anos!  Esse pequeno réptil sapiente, descobriu por si só, que chacoalhando o cálice seco da fruta, a liberava e a comia!
Essa experiência faz reforçar a ideia de que o Universo é um grande pensamento. “Deus não joga dados com o Universo,” diria Albert Einstein, esse grande cientista-místico universal! Entendendo que Deus creou um mundo determinista e não um mundo probabilístico. Nada acontece por acaso. Absolutamente tudo tem uma razão de ser. Razão que nasce da Fonte, do Todo, do pensamento cósmico absoluto.
Portanto, o que podemos intuir desse fato vivido é que o pequeno réptil tem uma inteligência particular, uma razão condicionada ao seu estágio de evolução; mas pensa, tem consciência individual própria e habilidade de articular uma estratégia, pois o fruto foi introduzido, não é nativo da Austrália; a ação requerida para abrir o invólucro foi pensada!
Considerar o homem como coroa da creação é subestimar a importância que os outros seres vivos têm no conjunto dessa mesma creação. Tão pouco sabemos sobre os não humanos e ainda desconhecemos o muito que nos oferecem. É ignorar que no semblante de um não humano que não fala, existe todo um discurso que só o espírito sábio é capaz de compreender.
“Enquanto o homem não estender o âmbito de sua compaixão a todas as coisas vivas, ele não encontrará a paz.” Albert Schweitzer

THE BLUE TONGUE LIZARD

 “Man can no longer live for himself alone. We must realize that all life is valuable and that we are united to all life. From this knowledge comes our spiritual relationship with the Universe.” Albert Schweitzer
Following the same approach with the latest publications on the facts of nature, and man in its context, of the presence of other beings sharing our space on Earth, follows a curious observation about the behavior of a graceful and harmless lizard that inhabits much of the Australian territory.
On this vast continent island, in its westernmost state, there is a small and quiet town of just over 25,000 inhabitants. A paradise of green, exotic and abundant flora and fauna, beautiful and crystal-clear landscapes and beaches; Albany, 500 kilometers south of the capital Perth. The bungalow where I have lived for over 3 years is literally in the middle of the woods, near the beach, where I made my exile and pilgrimage in books and in the sound of music.
It was a complete routine, as routine, discipline and reason are all the phenomena of Nature ... but, daily broken with new facts that came exactly from the surrounding environment, this great sacred book which fascinates, since dawn silently broken by singing birds, to the intense colours of dusk. If it was a rainy day, our sister Natura's brilliance did not fade, for the sun rays of Life as it penetrated the raindrops, opened a majestic and most enchanting exhibitions, the intense rainbow, of which Albany is famous.
And other residents, too, in this harmony of living beings ... and in particular, one of the most venomous and aggressive snakes, the eastern brown, the second most dangerous ... so any wandering in the vicinity was of intense vigilance; In fact, in Australia, inhabit the 10 most venomous snakes on the planet!
But not everything seems dangerous in the world of reptiles!
The backyard was inhabited by the most distinctive native plants, but there was a vegetable being, which I later discovered to be alien on the continent, producing a small edible yellow fruit resembling a mini tomato ... in fact a sweet, juicy, sugary flavour. It is known as a yellow variety of Physalis solanaceae - its scientific name.
One hot afternoon, concentrating on my studies, leaving only a small gap in the glass door - just in case I wasn't surprised by snakes - I heard a distinct rattling, a soft noise on dry straw from the yard. Curious and careful, I ventured slowly to inspect what had happened when I came across a graceful lizard, not giving much attention of my presence, and more focused on delighting its delicacy, from time to time looking at me and shooting me out with its hiss, showing from within a pink mouth, a brightly colored blue tongue! The rattle came from the noise it made to rid the small fruit trapped in its calyx. In fact, the fruit is wrapped in a modified leaf until it ripens, which when dry, partially releases the fruit from within. A kind of natural protection that sister Natura designed to perpetuate the life of this vegetable.
While experiencing the interesting scene, I pondered the attitude of the little animal, almost two-foot-long, its shiny scaly skin colored black, cream, brown, rattling the dry coating until it released the fruit and ate it. Then repeating the task until it was satisfied. For my part, while I ate some myself, I offered to the lizard, who without fearing the proximity of my hands, opened its mouth and ate.
Yellow and bright blue offer a perfect match!
Where did this creature learn to act this way ... how many thousands of years did it take to master this survival technique?
With my spirit even sharper, I went to look for the origins of this plant and some of the life of this graceful being. And it is not to my surprise that I discovered that this fruit was introduced to Australia in the mid-nineteenth century from the Peruvian Andes! So, it was in vain my insipient theory of thousands of years! This sapient little reptile, discovered by itself, that shaking the dry fruit calyx it could release the fruit inside and eat it!
This experience reinforces the idea that the Universe is a great thought. “God doesn't play dice with the Universe,” would say Albert Einstein, this great universal mystic scientist! Meaning that God created a deterministic world and not a probabilistic one. Nothing happens by chance. Absolutely everything has a reason for being. Reason that comes from the Source, the Whole, the Absolute Cosmic Thought.
Therefore, what we can intuit from this lived fact is that the small reptile has a particular intelligence, a reason conditioned to its stage of evolution; but it thinks, has its own individual conscience and the ability to articulate a strategy, for the fruit has been introduced, it is not native of Australia; The action required to open the calyx has been thought of!
To consider man as the crown of creation is to underestimate the importance that other living beings have in the whole of that same creation. We know so little about nonhumans and still do not know how much they offer us. It is to ignore that in the countenance of a nonhuman who does not speak, there is a whole speech that only the wise spirit can comprehend.
“Until man extends the circle of his compassion to all living things, he will not himself find peace.”Albert Schweitzer