Ter - ou Ser?
Duas atitudes eternamente incompatíveis.  O homem 
que tem algo não pode ser alguém e vice-versa.
O homem profano só conhece o ter, ou 
seja, um certo número de objetos quantitativos que estão ao redor dele no nível 
horizontal terreno, e que ele considera ingenuamente como sua propriedade.  O 
homem profano nada sabe de seu íntimo ser, de algo que não é 
dele, mas que é ele mesmo.  Alguém pode ter muitas posses 
terrenas, mas, ao mesmo tempo ser um mendigo indigente no nível vertical de seu 
ser divino.  De tanto ter, não chega a ser alguém.
Tudo quanto o homem possui de bens terrenos, o 
torna dependente e escravo; enquanto o homem tem algo que o mundo lhe possa 
tirar, ou deseja algo que o mundo lhe possa dar, não é definitivamente 
livre.
A idéia do meu nasceu com a idéia do 
eu; quando esse eu morre, morrem necessariamente todas as ilusões 
relacionadas com o meu.  Quem tudo é, nada tem; a intensa luminosidade 
do ser aniquila todas as trevas do ter.  Quem na realidade 
está em busca do reino dos céus e suas riquezas, nada tem e nada quer ter para 
si mesmo, embora possa prestar-se como administrador dos bens de Deus em favor 
de seus irmãos.
O que eu considero meu só tem função 
enquanto ainda vive em mim a noção do eu físico-mental; no momento em 
que o meu pequeno eu pessoal se afogar nas profundezas do TU divino e 
no vasto NÓS da humanidade, esse conceito de meu deixa de ter razão de 
existir.
Por isso, o homem que atingiu a plenitude do seu 
ser, pelo despontar da consciência cósmica, perde toda a noção de posse 
e propriedade.  Nada adquire e nada perde.  O fluxo e refluxo incerto de lucros 
e perdas deixou de existir para ele, e com isso foi eliminada a fonte principal 
da inquietação que atormenta os profanos.  Nada possui que o mundo possa lhe 
tirar, e nada deseja possuir que o mundo lhe possa dar.  Entretanto, se as 
circunstâncias terrenas o nomearam administrador do patrimônio de Deus e da 
humanidade, esse homem administra com a máxima solicitude esse patrimônio 
terrestre universal.
Pela mesma razão, o homem que se despojou das 
suas possessões, pela maturação do ser não experimenta a menor dificuldade nem 
tristeza em passar para outras mãos a administração dos negócios temporários que 
lhe foi confiado. 
O grande industrial norte-americano R.G. Le 
Torneau*, fabricante de possantes máquinas de terraplenagem, mandou colocar 
sobre a entrada de uma de suas fábricas a seguinte afirmativa:  “Não digas: Quanto do meu dinheiro eu dou a Deus? Dize 
antes: Quanto do dinheiro de Deus eu guardo para mim?” 
Esse homem descobriu que nós não temos dinheiro 
algum, mas que todas as coisas do mundo são de Deus; entretanto, pode o 
administrador dos bens de Deus tirar para si uma pequena “comissão”. Le Torneau, 
no princípio, tirava uma comissão de 90% para si, dando 10% a Deus, para fins de 
altruísmo e religião; por fim inverteu as quotas, dando 90% para Deus e 
guardando 10% para si, e mesmo assim, desses 10% ele não se considerava 
proprietário, senão apenas administrador, porque também esse dinheiro pertencia 
a Deus e à humanidade.
O EU verdadeiro, divino, nada sabe de possuir, 
porque o apogeu do ser, provoca o nada do ter. 
Nota: 
* Os contemporâneos de Le Torneau o qualificavam 
de “O homem de negócios de Deus”. 
Texto extraído do livro Assim Dizia o Mestre 
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