Há entre os coleópteros um inseto que, em pleno brilho e cores de belezas primaveris, só se interessa por uma coisa – pelo esterco.
Encontrar entre as flores de um canteiro um monte de esterco é para ele indescritível delícia.
Não importa que todas as flores espalhem a fragrância dos seus perfumes – o besouro só anseia pelas fétidos odores de substâncias putrefatas.
É este o seu elemento, o seu clima, o seu paraíso ...
Assim como esse besouro, existem almas humanas mesquinhas que encontram intenso prazer em chafurdar na lama de escândalos e remexer latas de lixo em casa alheia.
Descobrir faltas no próximo, fazer estatísticas das fraquezas alheias e mostrá-las na praça da mais larga publicidade – é nisto que se baseia a maior delícia dos besouros humanos.
Floresça na alma do irmão um jardim de virtudes, brilhe um paraíso de boas qualidades – o besouro humano logo descobre a imundície, por mais oculta e insignificante que seja.
Tão apurado é o senso de olfato do humano coprófago que entre mil perfumes suaves, distingue logo o mau cheiro da podridão que procura.
Quanto mais raquítico e depauperado é um caráter, tanto mais sente a volúpia de fazer estatística dos pecados alheios e catalogar as virtudes próprias que julga possuir.
Quanto mais perfeito é um homem, tanto mais benévolo é com os outros e tanto mais severo consigo mesmo.
O homem que não “brinca de religião”, mas toma a sério a sua fé, acha ridículo reparar nas fraquezas do próximo, porque sabe que ele também tem faltas, ainda que talvez de outra natureza.
Não agradece a Deus “por não ser como o resto dos homens, mentirosos, ladrões, injustos e adúlteros” – mas bate no peito e, de olhos baixos, murmura: “Meu Deus, tem piedade de mim que sou um pecador.”
O homem sincero e de boa vontade não começa a “reforma da humanidade” na casa do vizinho – mas sempre na própria casa ...
Só teria direito a condenar os outros quem fosse perfeito em todo o sentido – mas, coisa estranha! precisamente o homem perfeito é o que menos censura os outros.
Quando os fariseus sem caridade arrastaram aos pés de Jesus, a adúltera apanhada em flagrante, disse: “Aquele dentre vós que for sem pecado atire a primeira pedra!”
E eles, perplexos, se retiraram, certos de que a clarividência de Jesus lhes conhecia o negror da consciência ...
Ficaram só a mulher pecadora e o “homem sem pecado” – podia este lançar à adúltera a primeira pedra, a primeira e a última.
Mas, como podia o “homem sem pecado” ser um homem sem piedade?
Como podia a suprema pureza deixar de ser a infinita caridade?
E ele, em vez de lançar pedras mortíferas à pecadora – lançou palavras de perdão e de vida à penitente: “Nem eu te condenarei; vai-te e não tornes a pecar.”
Assim são as almas grandes, puras, sublimes – benévolas, porque compreendem ...
Texto revisado extraído do livro De Alma Para Alma
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