Saturday 8 January 2022

NINGUÉM VAI AO PAI A NÃO SER POR MIM

Estas palavras de Jesus têm causado estranheza e incompreensão, sobretudo no oriente, pois não parece presunção afirmar que nenhum homem possa chegar a Deus senão através do Cristo? E os povos que nada sabem do Cristo?

Mas não é este o sentido das palavras proferidas por Jesus.

Ocorre que o mal está em se identificar o Cristo cósmico com o Jesus humano, através do qual o Cristo se manifestou.

A suprema Divindade Transcendente e Universal, que no Evangelho aparece como o “Pai”, pode ser imaginada como um mar imenso, infinito, sem princípio nem fim; o Cristo cósmico, como um canal principal que parte desse mar e se lança pela Terra.  Desse canal principal, repleto de água-viva (as mensagens de Jesus), partem numerosos canais secundários, maiores e menores, que recebem as suas águas diretamente do canal principal do Cristo, ainda que indiretamente do mar da Divindade. Assim, em uma analogia, o canal principal poderia dizer aos canais secundários: nenhum de vós recebe algo do mar a não ser por mim.

Nesse sentido, Jesus disse, referindo-se ao seu Cristo: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida; quem me segue não anda em trevas, mas tem a luz da vida”.

Esta verdade sugere o seguinte: parece difícil para o ser humano comum entrar diretamente em contacto com a Divindade, pois a habilidade receptiva do homem é pequena demais para receber em si algo do imenso mar da Divindade transcendente, que o Cristo chama o Pai. O homem comum necessita de um intermediário, de um mediador, de um elo de ligação, de um Deus-homem, de um Verbo feito carne, para estabelecer contacto entre o homem e a Divindade.

O Cristo cósmico é a primeira e mais alta singularidade individual da Divindade Universal; é uma creatura cósmica, antes de se tornar uma creatura telúrica em Jesus. O Cristo cósmico era Deus, o Unigênito do Pai, e por isto mesmo o Primogênito de todas as creaturas. Ele era Deus, mas não era a Divindade. Muitos podem ser Deus, ninguém pode ser a Divindade.

O Unigênito do Pai é o canal principal do mar da Divindade, e desse canal partem outros canais secundários. A ligação com esse canal principal nada tem a ver com ocidente ou oriente, cristão ou pagão; depende unicamente do estado de consciência espiritual de cada ser humano. Mahatma Gandhi era, certamente, um canal firmemente ligado ao canal principal do Cristo, embora não fosse oficialmente cristão; era tão crístico e tão pouco cristão que podia dizer aos missionários cristãos que procuravam convertê-lo ao cristianismo deles: “Aceito o Cristo e seu Evangelho – mas não aceito o vosso Cristianismo”.

Um homem pode ser 100% crístico ou cristificado e ao mesmo tempo 0%cristão. O Cristo não fundou o cristianismo, que é obra dos seus discípulos.

A individualidade do Cristo cósmico era o princípio de todos os princípios, “antes que o mundo existisse”. A personalidade de Jesus apareceu na Terra há mais de 2000; agora, se o Cristo se personificou em outras regiões dos Cosmos, não se sabe, não se pode afirmar ou negar. Portanto, qual o significado das palavras misteriosas dele: “Na casa de meu Pai há muitas moradas”? O texto do grego diz muitas “permanências”, ou modos de estar – talvez personificações, modos de encarnação ou de se tornar humano.

A encarnação do Verbo, do Cristo cósmico, não foi um ato compulsório de reencarnação, mas uma decisão livre. Quando alguém reencarna, obedece a uma lei necessidade; quando o Cristo encarnou em Jesus, o fez por amor, na culminância da liberdade.

E é precisamente aqui que começa o mistério dos mensageiros da Divindade, quando se acham em elevado grau de evolução ascensional: não querem apenas gozar o seu amor, querem sofrê-lo. Nenhum deles se contenta com um gozo gozado, querem um gozo sofrido.

A encarnação do Cristo-Logos é uma personificação considerada como uma espécie de involução, mas é na verdade, uma evolução, como Jesus diz aos discípulos de Emaús: “Não devia o Cristo sofrer tudo isto, para assim entrar em sua glória?” Glória é a sua auto-realização, o que se faz através do sofrimento voluntário, do sofrimento-amor. Quando, no Gólgota, ele disse: “Está consumado”, referia-se à consumação da sua evolução terrestre, prelúdio da sua entrada na glória. A consumação do Jesus telúrico é a glória do Cristo cósmico.

Quando Jesus disse “ninguém vai ao Pai a não ser por mim”, ele se referiu ao seu Cristo cósmico, e não ao seu Jesus humano. O Cristo cósmico, é único, mas pode se tornar humano em muitos outros seres.

O Cristo se torna humano de acordo com a habilidade dos recipientes, e também de acordo com as necessidades de cada época e de cada povo. Não há ponto final na evolução de nenhuma creatura; toda a creatura, por mais evolvida, é sempre passível de evolução futura.

A despeito de tudo isto, continua a ser verdade que nenhum homem vai à Divindade a não ser através do canal principal da primeira e mais alta emanação individual da Divindade Universal.

Texto revisado, extraído do livro QUE VOS PARECE DO CRISTO?

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