O pecado só é possível quando se vive sob a sombra da ego consciência, criada pelo intelecto. O pecado não é possível nas trevas da inconsciência, que envolve o mundo dos sentidos materiais; nem tampouco é possível na luz da consciência plena, que ilumina as alturas espirituais da razão, do Logos, que, em sua forma encarnada, é o Cristo.
Nem a inconsciência nem a consciência plena conhecem o pecado. O pecado é um fenômeno privativo do ser semiconsciente. Nem os sentidos nem a razão podem pecar; nem o corpo nem a alma pecam – somente a inteligência do ego mental.
Sendo o Cristo a Razão, o Logos, o Espírito divino – como poderia haver pecado no nível da impecabilidade?
Deus é transcendente a tudo e imanente em tudo.
Na sua essência, Deus é totalmente presente e imanente em tudo – mas no nível da manifestação dessa sua essência há grandes diferenças. Deus, embora imanente em cada ser, a percepção dessa essência não é percebida do mesmo modo em todos os seres. A sua essência é invariável, mas a sua manifestação é variável.
Deus é inconsciente no mineral.
Deus é subconsciente no vegetal.
Deus é semiconsciente no animal.
Deus é ego consciente no intelectual.
Deus é plenamente consciente no racional.
Deus é totalmente consciente em si mesmo.
Só na zona escura da ego consciência é que é possível o pecado.
O pecado supõe consciência, porém uma consciência imperfeita.
O pecado consiste na ilusão da nossa separação de Deus, ilusão essa creada pelo intelecto.
Somos distintos de Deus porque ele é transcendente a cada uma das suas creaturas, mas não estamos separados, porque Deus está imanente em cada uma das suas creaturas. Não somos idênticos nem separados – mas distintos, porque somos iguais pela essência divina universal – e somos desiguais pela existência humana individual.
O dualista afirma a transcendência e nega a imanência.
O panteísta nega a transcendência e afirma a imanência.
O monoteísta absoluto, o monista ou universalista, afirma tanto a transcendência como a imanência, atingindo assim a verdade total.
O intelecto separatista nos faz pecar – a razão que une nos redime do pecado.
O intelecto é o precursor da razão – a razão integra em si o intelecto.
Só pode nos redimir, aquele que é redimido.
Só quem nunca pecou nos pode purificar do pecado.
Ninguém vai ao Pai a não ser pelo Cristo, que é o divino Logos, a Razão suprema, que se fez carne e habitou entre nós, historicamente, na pessoa de Jesus e de outros iluminados – e habita em cada um de nós, permanentemente, na forma daquela “luz que ilumina a todo homem que vem a este mundo... e dá àqueles que a recebem o poder de se tornarem filhos de Deus”; pois esse Cristo do passado está presente em cada um de nós, “eu estou convosco todos os dias até à consumação dos séculos”.
“Quem de vós pode me acusar de algum pecado?” Só o homem no qual o Cristo interno tenha despertado plenamente, pode fazer uma pergunta dessas; homem redimido de seu egoísmo e consciência pecadora; homem penetrado pelo amor universal.
***
Sócrates afirmava que a ignorância é o grande pecado do homem – assim como a sapiência, é a sua grande virtude.
O pecador é o ignorante – o santo é o sábio.
Sabedoria ou sapiência, não quer dizer erudição meramente intelectual, mas sim a intuição espiritual, o contato direto com a suprema e última Realidade, com o Absoluto e Infinito (Deus), presente em cada homem como sua alma. A insipiência ou o pecado pode coexistir com a erudição intelectual no mais alto grau, mas não com a verdadeira sapiência, que é a própria santidade no homem.
As palavras de Jesus na cruz: “Pai, perdoa-lhes porque não sabem o que fazem”, estão na linha do pensamento de Sócrates: o homem peca porque “não sabe o que faz”; se soubesse, não pecaria.
Texto revisado extraído do livro Assim Dizia o Mestre
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