O ensaio abaixo,
do original em inglês, “Self, Silence and Maharishi Ramana”, é de autoria do
doutor em filosofia, educador, ex-professor e chefe do Departamento de
Filosofia da Universidade de Nova Deli, Índia, Ashok Vohra (1949-), e que vem
adicionar mais brilho em torno da figura carismática de Ramana, considerado o
mais famoso sábio vidente do século XX.
Muito se tem
escrito sobre Ramana, incluindo o livro Face a Face com Sri Ramana Maharshi,
numa série de 202 impressões particulares de pessoas que conviveram com ele e
sobre ele. No entanto, Ramana nunca se sentiu movido a formular seus
ensinamentos por conta própria, seja verbalmente ou por escrito. O pouco que a
ele é creditado, surgiu como respostas a perguntas feitas por seus discípulos
ou por sua insistência, e apenas alguns hinos foram escritos por iniciativa
própria.
Segundo Mouni
Sadhu, autor conhecido do público brasileiro pelo livro DIAS DE GRANDE PAZ,
Vivência da Mais Alta Yoga, edição revista e anotada por Huberto Rohden, em
Maharshi, “reina o silêncio”, uma vida introspectiva, atenta apenas à sua
autorrealização, a despeito de ter sido um homem que vivia no mundo, mas não
sendo deste mundo.
“Refletindo sobre
a questão humana, Adi Shankracharya, filósofo e teólogo indiano, em seu
Bhajagovindam (poemas devocionais), afirma que: “Uma pessoa se interessa por
brincar quando é criança; se interessa pelo sexo, quando é jovem, e, quando
envelhece, fica perdido em pensamentos, pois ninguém está interessado em
indagar o que é o verdadeiramente real”. A natureza do “verdadeiramente real”
só pode ser descoberta apenas ponderando sobre as questões: “Quem é você? Quem
sou eu? De onde eu vim? Quem é minha mãe? Quem é meu pai?”, persuadindo a
“contemplar a natureza mutante da vida que é quase como um sonho e desistir do
apego extremo”. O “verdadeiramente real”, segundo ele, não está situado no
mundo exterior, mas é interno aos seres humanos, e que é preciso fazer um
esforço consciente e diligente para olhar para dentro de si mesmo. O ser humano
“foi creado com os órgãos dos sentidos voltados para fora e, portanto, vê o
mundo externo e não o Eu interno. Quem é sábio, que deseja a imortalidade, vê o
seu interior, voltando os olhos para dentro de si mesmo”.
Ramana Maharshi
aprendeu esta dura verdade durante suas duas “experiências de morte”, sendo a
primeira, acontecido cerca de seis semanas antes de deixar sua casa, em direção
a Arunáchala em 1886, onde ele diz:
Eu estava sentado
e só, em uma sala no primeiro andar da casa do meu tio. Raramente eu ficava
doente e naquele dia não havia nada de errado com minha saúde, mas um medo
violento e repentino da morte tomou conta de mim. Nada que explicasse isso, e
nem havia em mim qualquer desejo de descobrir se havia alguma razão para o
medo. Eu simplesmente senti que ia morrer e comecei a pensar no que fazer a
respeito. Não me ocorreu consultar um médico ou amigos e senti que tinha que
resolver o problema por mim mesmo. O choque do medo da morte dirigiu minha
mente para dentro, dizendo a mim mesmo sem formular conceitos em palavras:
agora, a morte chegou! O que isso significa? O que é isso que está morrendo?
Este corpo morre? E imediatamente dramatizei a ocorrência da morte. Deitei-me
com os membros estendidos como se a rigidez após a morte se instalasse,
imitando um cadáver para dar maior realidade à investigação. Prendi a
respiração e mantive meus lábios fechados para que nenhum som pudesse escapar.
E, disse a mim mesmo: este corpo está morto. Ele será carregado para cremação e
reduzido a cinzas. Mas com a morte do corpo, estou realmente morto? O corpo é o
Eu? Está silencioso e inerte, mas sinto toda a força da minha personalidade e
até a voz Eu dentro de mim! Consequentemente, eu sou Espírito transcendendo o
corpo. O corpo morre, mas o espírito que o transcende não pode ser tocado pela
morte. Isso significa que eu sou o Espírito Imortal. Tudo isso passou por mim
não como um pensamento tolo, mas como verdade viva que percebi diretamente,
quase sem o uso da mente. O Eu era algo real, a única coisa real sobre o meu
estado, e toda a atividade consciente conectada com o corpo foi canalizada
nesse Eu. Daquele momento em diante, a atenção se concentrou em mim mesmo, no
meu Eu, de forma fascinante, desaparecendo, assim, o medo da morte. O ego se
perdeu no fluxo da autoconsciência e a absorção no Eu continuou ininterrupta.
Outros pensamentos podem ir e vir como as várias notas musicais, mas o Eu
continuou como a nota fundamental; nota que está subjacente e se mistura com
todas as outras notas.
A segunda
experiência de morte aconteceu em 1912, quando ele tinha 33 anos. Naquela
época, Ramana vivia na Caverna Virupaksha na colina de Arunáchala. Seu
companheiro Vasudeva Sastri percebeu que Ramana havia falecido e começou a
chorar e lamentar. A experiência da morte foi sentida três vezes em rápida
sucessão. Ramana sentia como se uma cortina branca estivesse sendo fechada;
escuridão e um esmorecimento cobriram sua visão. Como resultado, ele não
conseguiu ficar de pé e teve que se sentar na rocha. Sua pele ficou azul; a
respiração e circulação sanguínea pararam. Descrevendo essa experiência, ele
diz: “Eu pude ver claramente o processo gradual. Houve uma fase em que eu ainda
podia ver uma parte da paisagem claramente enquanto o resto estava coberto pela
cortina que avançava. Era como uma visão em um estereoscópio. Ao experimentar
isso, parei de andar para não cair. Assim que a visão clareou, eu continuei
andando. Quando a escuridão e a fraqueza tomaram conta de mim pela segunda vez,
encostei-me em uma rocha até que a visão clareasse. Na terceira vez que
aconteceu, achei mais seguro sentar perto da pedra. Então, a cortina branca
brilhante bloqueou completamente minha visão, a cabeça girou e minha circulação
e respiração pararam. A pele ficou de um azul lívido. Era a tonalidade normal
da morte e foi ficando cada vez mais escura. Ele narra a segunda experiência de
morte, assim:
“Meu nível normal
de consciência ainda continuava naquele estado também. Não tive o menor medo e
não me senti mal com a condição do corpo. Sentei-me perto da rocha na minha
postura habitual. O corpo, deixado sem circulação ou respiração, ainda se mantinha
nessa posição. Esse estado continuou por cerca de dez ou quinze minutos. Após,
um choque passou repentinamente pelo meu corpo; a circulação e a respiração
voltaram, enquanto o corpo suava por todos os poros. A cor da vida reapareceu
na pele. Abri meus olhos, levantei e disse: Vamos adiante! Chegamos à caverna
sem maiores problemas. Foi a única convulsão que tive em que a circulação e a
respiração pararam”.
Ao contrário da
primeira experiência de morte, que foi a experiência de um jovem, a segunda foi
a experiência de uma pessoa madura. Ramana estava consciente durante todo o
período em que passou por esta experiência, podendo sentir Sastri batendo
palmas, arrepiado, suas palavras de lamentação e compreender seu significado.
Também vi a descoloração da minha pele e senti a interrupção da minha
circulação e respiração e o aumento do frio nas extremidades do meu corpo. Meu
nível de consciência ainda continuava naquele estado também. Não tive o mínimo
medo e não senti tristeza pelo estado do corpo. Segundo ele, “essa foi a única
convulsão que tive em que a circulação e a respiração pararam. Não provoquei
propositadamente a convulsão e nem queria ver como este corpo ficaria após a
morte, tampouco não deixarei este corpo sem avisar os outros. Era uma daquelas crises
que eu tinha de vez em quando, só que dessa vez foi de uma forma muito séria”.
A segunda,
aconteceu em 1912, aos 33 anos. Naquela época, ele vivia em uma caverna (na
colina de Arunáchala. O companheiro de Ramana, Vasudeva Shastri, sentiu que ele
havia falecido e começou a lamentar e chorar. A experiência da morte foi
sentida três vezes em rápidas sucessões, como se uma cortina branca se
fechasse, seguido de uma perda de sentidos e a escuridão tomando conta de sua
visão. Como resultado, não conseguia ficar em pé; sua respiração e circulação
sanguínea pararam e a pele com coloração azulada. Descrevendo sua experiência,
ele diz: Eu pude ver claramente o processo gradual. Houve uma fase em que eu
ainda podia ver uma parte da paisagem claramente enquanto o resto estava
coberto pela imagem da cortina que avançava. Era como enxergar em uma visão
estereoscópica (de terceira dimensão), e ao experimentar isso, parei de andar
para não cair. Quando clareou, continuei andando. Quando a escuridão e a
fraqueza tomaram conta de mim pela segunda vez, encostei-me em uma rocha até
que a visão clareasse. Na terceira vez que aconteceu, achei mais seguro me
sentar, e então, a cortina branca e brilhante bloqueou completamente minha
visão, minha cabeça girou e minha circulação e respiração pararam. A pele ficou
de um azul lívido. Era a tonalidade normal da morte e foi escurecendo mais e
mais.
Meu nível normal
de consciência continuava naquele estado, e não tive medo e não me senti mal
com a condição do corpo. Sentei-me perto da rocha na minha postura habitual, e
fechei os olhos; o corpo, deixado sem circulação ou respiração, ainda mantém
essa posição. Esse estado continuou por cerca de dez ou quinze minutos. E
subitamente, um choque passou pelo meu corpo e a circulação e respiração
voltaram, enquanto eu transpirava por todos os poros. A cor da vida reapareceu
na pele. Abri então os meus olhos, levantei e disse; vamos adiante! Chegamos à
caverna sem maiores problemas. Foi o único ataque que tive em que a circulação
e a respiração pararaAo contrário da primeira experiência de morte, que foi a
experiência de um jovem, a segunda foi a experiência de uma pessoa madura.
Ramana estava consciente durante todo o período em que passava por essa
experiência, e que “podia sentir seu companheiro lamentando e ouvir suas
palavras e compreender seu significado. Também vi a descoloração da minha pele
e senti a parada da minha circulação e respiração e o aumento do frio nas
extremidades do meu corpo. Meu nível normal de consciência continuava naquele
estado. Não tive o mínimo medo e não senti tristeza pela situação do meu
corpo”. Segundo ele: “Essa foi a única convulsão que tive em que a circulação e
a respiração pararam. Nada provoquei e nem queria ver como meu corpo ficaria
após a morte, nem disse que não deixarei este corpo sem avisar os outros. Era
uma daquelas crises que eu tinha de vez em quando, só que dessa vez foi de uma
forma muito séria”.
É importante notar
que ao contrário da primeira experiência, em que não houve parada da respiração
e da circulação, descoloração da pele, etc., havia o medo da morte, de deixar o
corpo. Na segunda, não houve medo, nem ansiedade. Ramana estava totalmente
ciente da diferença entre “convulsões” e “experiência de morte”, com isso, não
se pode concluir, de acordo com os céticos, que Ramana teve realmente a
experiência comum de uma convulsão.
A partir dessas
“experiências de morte”, Ramana existencialmente percebeu a temporalidade do
corpo e a permanência do Eu. Segundo ele: Na visão da morte, embora todos os
sentidos estivessem entorpecidos, a autoconsciência era claramente evidente, e
então percebi que era a consciência que chamamos de Eu, e não o corpo. Essa
autoconsciência nunca se deteriora; a nada está relacionada; mesmo se esse
corpo for cremado, ele não será afetado. Portanto, percebi claramente naquele
dia o que era aquele Eu. A reflexão sobre a experiência do Eu, levou Ramana a
investigar a sua verdadeira natureza. Em sua obra escrita, A Realidade em
Quarenta Versos, contêm descrições concisas da auto indagação. No versículo
trinta, ele diz: Questionando “Quem sou eu?” mentalmente, e atingindo o
Coração, o ego individual desmorona, e imediatamente a realidade se manifesta
como o verdadeiro Eu divino, o Ser Absoluto. Os versos dezenove e vinte da
Essência de Todas as Instruções Espirituais, também por ele escrito, descrevem
o mesmo processo em termos quase idênticos:
19)- De onde surge
o Eu? Busque isso dentro de você. E, consequentemente, o ego desaparece, e está
é a busca pela sabedoria.
20)- Onde o ego
desapareceu, aparece o Eu essencial divino, o Infinito.
Portanto, a
realização do Eu, não é a realização do ego, ou do eu individual, mas do Eu
universal não dual. Como consequência desta constatação, não há outro eu (ego),
que é uma construção mental. Segundo Ramana: O Ser real (a Divindade) ou o Eu
real é, contrário a experiência perceptível, não uma experiência de
individualidade, mas uma consciência não pessoal e inclusiva. Não deve ser
confundido com o ego individual, que segundo ele, é essencialmente inexistente,
sendo uma fabricação da mente, que obscurece a verdadeira experiência do Eu
real. Afirmando ainda que o Eu real está sempre presente e sempre
experienciado, mas enfatizou que só se tem consciência dele como realmente é
quando as tendências autolimitantes da mente, cessam. A autoconsciência
permanente e contínua é conhecida como autorrealização. Em seu poema, Cinco
Versos Sobre a Unidade do Eu, composto em fevereiro de 1947, ele usa a alegoria
do ornamento e do ouro para explicar a essência do Eu e a natureza do
relacionamento Eu essencial divino e o Ser, dizendo: “Como o ornamento não está
separado do ouro, o corpo (ego) não está separado do Eu. Os ignorantes
confundem o corpo com o Eu; o sábio sabe que só o Eu é real”. Só é real porque
o Eu é a verdadeira natureza de cada um. Isso não se pode mudar; todo o resto
muda e passa e, portanto, não é natural”.
Ramana sempre
levou uma vida simples, e era avesso à pompa e ostentação, nunca permitindo que
o louvassem. Sempre que tivesse que participar em algumas ocasiões cerimoniais
e ouvir elogios e hinos de louvor, ele participava apenas como testemunha do
que estava acontecendo e ouvia as aclamações não como dirigidas a ele, mas
apenas como mais um na plateia. E não gostava do significado especial atribuído
a seu aniversário e da celebração por seus devotos. Quando da única celebração
feita em 1912, assim ele expressou seu descontentamento:
“Você, que gosta
de comemorar o aniversário de forma grandiosa, procure primeiro, a essência do
seu nascimento. O dia do verdadeiro nascimento é aquele em que a pessoa nasce
para a Realidade que é uma, e que não tem nascimento nem morte. Observar o dia
como um festival é como decorar um cadáver. A sabedoria reside em realizar o Eu
e fundir-se nele.”
Ele era contrário
a todo tipo de discriminação, tratamento especial ou diferenciado; não tinha
preferências e preconceitos, nem gostos e desgostos. Tratava a todos
indiscriminadamente, ricos e poderosos, camponeses pobres e pessoas comuns. Ao
fazer isso, Ramana praticava o não dualismo em sua vida cotidiana, e que nada
existe à parte da Realidade Absoluta, o Espírito Supremo que é a realidade
última, pois ele enxergava o Eu essencial divino habitando em todos, sendo
equânime e assumindo atitudes de indiferença em todas as situações e
circunstâncias. Sentar-se atrás de portas trancadas ou ao ar livre era o mesmo
para ele; que não havia ninguém sentado, nenhuma porta estava trancada e nenhum
templo servia de abrigo. Ramana não tinha um lar; sua sabedoria havia se
firmado na realidade imutável. Não importava o ambiente e nem o estado de vida
que levava, Ramana sempre permaneceu fixo no seu estado natural de pleno
conhecimento do Eu, ou da verdadeira natureza do ser. Segundo ele, não havia
regras a serem seguidas e que tudo estava em perfeita ordem e que quando se
atinge um estado de iluminação, de identidade com o Eu, as regras deixam de
existir e nem votos a serem cumpridos. Depois de chegar ao fim, qual a
utilidade dos meios, por mais remotos que sejam? E isso está de acordo com o destino,
afirmando ainda, que mesmo sob uma possível excitação do ego, em um ser
realizado, isso não afeta esse ser, pois o ego passa a ser inofensivo.
Ramana era avesso
a que o chamassem de guru, e muito menos de avatar. Não reivindicava a posse de
nenhum poder oculto e conhecimento do que era mais transcendente: não tinha
pretensões e resistiu a todos os esforços para canonizá-lo. Não iniciou uma
nova forma de culto ou escola de pensamento. Embora muitos tenham sido
influenciados e alegassem ter alcançado a liberação por razões de sua
associação com ele. Ramana nunca alegou ter discípulos, ou os reconheceu
publicamente como seres liberados; nunca nomeou nenhum sucessor para sua
herança e não promoveu nenhuma linhagem.
Na verdade, Ramana
tentou mostrar repetidamente que era como qualquer outro homem. E, quanto ao
seu conhecimento do Bhagavad Gita, afirmava não ter lido a respeito e nem de
comentários para descobrir seu significado. Quando ouvia um dos versos dessa
obra, entendia seu significado claramente, dizendo: isso é tudo e nada mais.
Ramana se
perturbava algumas vezes com o fluxo crescente e constante de devotos que
vinham ao Ashram para estar diante da sua graça e receber bençãos, já que suas
atividades normais no Ashram, ficavam restringidas. Ele mesmo confessou que
tentou fugir três vezes a fim de retornar a uma vida de solidão. Mas não se
aborreceu com seu fracasso, pois estava firmemente comprometido com o destino a
ser trabalhado na vida atual de cada um, pois Aquele cuja função é ordenar, faz
com que cada um atue. O que não está para acontecer, nunca acontecerá, qualquer
que seja o esforço que se faça. E o que está para acontecer, vai acontecer por
mais que se busque evitar. Isso é certo! A sabedoria, portanto, é permanecer na
quietude e viver de acordo com a plenitude das faculdades humanas.
Ele ensinava,
vivia e praticava a filosofia milenar dos Vedas, e tendo na prática do
silêncio, a mais perfeita instrução espiritual. Incluindo o seu silêncio sobre
seus estudos, pois segundo ele, apenas aquele que busca e num estado espiritual
mais elevado, tem a habilidade de compreender essa filosofia. Quando aos
demais, estes não têm essa habilidade, pois exigem palavras para explicação das
verdades contidas na filosofia. E que indicar a eles o estudo, isto sim é
possível, pois ocorre que a verdade está além das palavras, que não justifica
explicação. Ramana ensinava o método da auto investigação, contida na
filosofia, e que pode ser praticada por todos, independente de classe, casta e
o que representa na sociedade, ou por ateus, teístas, agnósticos ou céticos.
Mas ele mesmo não utilizava nenhuma categoria absoluta, ou seja, do mundo ser
uma ilusão ou real, que são termo relativos. Tanto o real como a ilusão são
baseados no senso de dualidade. O Eu é como é, “Sou o que sou”. Qualquer outra
forma de expressão, como eu sou X, Y ou Z, etc., dá origem ao ego e não ao
autoconhecimento. É por isso que se deve dizer: Eu, Eu; eu sou isso ou eu sou
aquilo, é do ego. O Eu não tem localização, periferia e centro. É ilimitado e
sem forma, e também é o centro espiritual. Existe apenas um centro desse tipo,
seja no Ocidente ou no Oriente, o centro não pode ser diferente. Não tem
localidade. Sendo ilimitado, inclui líderes, os mundos, forças de destruição e
construção. Mas não se pode falar em seres encarnados como líderes. Espíritos
não são corpos; não tem ciência de seus corpos, são espírito: ilimitados e sem
forma. Sempre existe unidade entre eles. Essas questões não podem surgir se o
Eu for realizado. Para os seres realizados, não há diversidade, mas apenas
unidade; não há individualidade, mas coletividade e universalidade.
Embora Ramana não
tenha criticado outras escolas ou métodos de ensino, ele afirmou que sua
técnica de auto inquirição, “Quem sou eu?” é diferente das técnicas de
meditação ensinadas pela tradição filosófica da não-dualidade, ou seja, “Eu sou
Shiva” ou “Eu sou Ele”, diferenciando-os nas seguintes palavras:
“A busca pelo Eu,
de que falo, é um método direto e superior. No momento em que se busca
profundamente pelo Eu, ele já está à espera, e então tudo é realizado de forma
distinta, e não como o indivíduo que procura, que não tem nenhuma participação
nisso. Nesse processo, todas as dúvidas e discussões são automaticamente
abandonadas, assim como quem dorme esquece dos cuidados do corpo.”
Trabalhando a
distinção entre o seu ensino e o de outros, disse ao famoso filósofo e
orientalista francês, Olivier Lacombe: “O ensino de Maharshi é apenas uma
expressão de sua própria experiência e realização”, e de que “Uma pessoa
realizada usará seu próprio idioma, e o silêncio é a melhor linguagem.” Ramana
escolheu o método do silêncio para a comunicação e transmitiu seus ensinamentos
por meio do silêncio.
A outra grande
diferença entre a escola tradicional não dualista, de que nada existe a não ser
o Espírito Supremo e os ensinamentos de Ramana é que, embora essa escola tenha
uma atitude negacionista – “não isso”, “não isso”, para descrever a realidade
última, também ensina as afirmações mentais de que o Eu era a única realidade,
como “Eu sou a Absoluta Realidade”, ou “Eu sou Ele”, Ramana enfatiza na
indagação: “Quem sou eu?”
Embora Ramana não
tenha reivindicado o status de guru, muitos estudiosos se tornaram seus devotos
a fim de se tornarem seus discípulos. Enquanto o homem comum queria conhecê-lo
para obter ganhos materiais, os estudiosos de todo o mundo tornaram-se seus
discípulos para aprender a natureza e a prática da sua espiritualidade,
sentindo que Ramana poderia dar este impulso iniciático com o toque ou com um
olhar. Sentado em silêncio, ele se virava repentinamente, fixava um olhar
intenso e a pessoa se tornava diretamente consciente do seu centro espiritual,
da sua atual consciência essencial. Aqueles que experimentaram o poder do olhar
de Ramana relataram que a iniciação foi tão clara e vívida que não tiveram
dúvidas de que ele não era outro senão seu próprio ser consciente essencial.
Alguns dos
discípulos sentiam que Ramana também iniciava as pessoas em sonhos ao olhar
fixamente em seus olhos, e ele às vezes viajava no corpo sutil para visitar as
pessoas. Apareceria para um discípulo a centenas de quilômetros de distância
como uma figura luminosa, e a pessoa reconhecia sua aparência nessa forma,
observando que a vida desperta e a vida onírica eram ambas uma espécie de
sonho, cada qual com diferentes níveis de consciência. Ele se referiu a esses
estados como “sonho 1” e “sonho 2”. E que não fazia distinção entre aparecer a
um discípulo acordado e a um discípulo que sonhava, pois considerava que as
duas esferas da existência eram sonhos. Na verdade, o próprio Ramana admitiu
isso para um devoto que queria ver sua forma real e que teve essa experiência.
Quando o devoto contou a ele sobre sua experiência, Ramana disse: “Você queria
ver minha forma; você viu meu desaparecimento; Eu sou sem forma. Então, essa
experiência pode ser a verdade”.
Afirmando ter tido
uma visão de Ramana, Francis Henry Humphreys, foi o primeiro europeu a se
encontrar com ele. Aprendeu o telugo, a língua local, com seu professor,
Ganapati Sastri e diante dele, desenhou a figura dessa visão, sendo que a
figura, era a de Ramana, guru de Sastri. Organizaram um encontro que se deu em
novembro de 1911, na caverna onde vivia. Impressionado com a experiência de
conhecer o vidente, ele registrou os detalhes desse encontro em uma carta que
foi publicada no International Psychic Gazette com as seguintes palavras:
“Às duas da tarde,
subimos a colina para vê-lo. Ao chegar à caverna, sentamo-nos diante dele, a
seus pés, e nada dissemos. Ficamos assim por um longo tempo e me senti alçado
para fora de mim mesmo. Por meia hora, olhei nos olhos do Maharshi, que nunca
mudaram sua expressão de profunda contemplação. Comecei a perceber então, que o
corpo é o templo do Espírito Santo; Eu pude sentir que seu corpo não era o do
homem; era o instrumento de Deus, meramente um cadáver imóvel sentado, do qual
Deus irradiava. Meus sentimentos eram indescritíveis.
O Maharshi é um
homem indescritível em sua expressão de dignidade, gentileza, autocontrole e
serena força de convicção.”
Humphreys
encontrou Ramana várias vezes depois. Suas ideias sobre espiritualidade mudaram
fundamentalmente como resultado de seus encontros com o guru. E registrou
assim, no Gazette, suas impressões dessas reuniões. “Não se pode imaginar a
beleza do seu sorriso, e a mudança que provoca estar em sua presença. Paul
Brunton, um jornalista conhecido, também registrou que teve uma experiência de
consciência sublimemente abrangente, um momento de iluminação enquanto
permanecia no ambiente de Ramana.” Murgnor narrou a sua experiência, com as
seguintes palavras: “Da mesma forma que a cera derrete ao encontrar o fogo, ao
ver seus pés, minha mente se dissolveu e perdeu sua forma. Assim como o bezerro
encontrando sua mãe, meu coração se derreteu e se alegrou a seus pés, e um
arrepio pelo meu corpo. A devoção cresceu em mim como um oceano que viu a lua
cheia. Pela graça do poder inerente à consciência, minha alma ficou em êxtase”.
A maioria das pessoas que viram Ramana, sentiam que “sentar-se diante dele já
era uma profunda educação espiritual. Olhar para ele era acalmar a mente. Cair
na esfera de sua visão beatífica era ser elevado interiormente”. Paul Brunton
expressou assim, o que a maioria dos visitantes e devotos sentiram ao ver
Ramana:
“Sua expressão é
modesta e suave, os grandes olhos escuros são extraordinariamente tranquilos e
bonitos. O nariz é curto, reto e regular. No queixo tem uma barba rala e a
significância de sua boca é mais perceptível. Tal rosto pode ter pertencido a
um dos santos que agraciaram a Igreja Cristã durante a Idade Média, exceto que
este possui a qualidade adicional de intelectualidade. Ele tem os olhos de um
sonhador, e há algo mais do que meros sonhos por trás daquelas pálpebras
pesadas”.
Os visitantes e
devotos vinham com perguntas sobre assuntos espirituais, e outros assuntos
enfrentados por eles, com a intenção de buscar respostas de Ramana. Mas suas
perguntas e dúvidas eram dissolvidas assim que chegavam diante de sua presença,
pois as questões que consideravam significativas e cruciais para eles pareciam
tolas e pueris. Na presença de Ramana, eles permaneciam “cheios de alegria e
paz que o desejo de fazer perguntas desapareceu”. A maioria dos devotos e
visitantes em sua presença, como Brunton registrou, “sentiam segurança e paz
interior. As radiações espirituais que emanavam dele eram todas penetrantes.
Aprendi a reconhecer em sua pessoa, as verdades sublimes que ensinava, e da paz
de sua atmosfera incrivelmente santa. Ele possuía uma personalidade divina que
desafiava qualquer descrição. Não se podia esquecer o seu sorriso maravilhoso e
repleto, com um toque de sabedoria e paz conquistados com o sofrimento e a
experiência. Era o homem mais compreensivo que já conheci; se podia ter certeza
sempre, de que algumas de suas palavras, suavizam os caminhos, e essas
palavras, intimamente, já davam as respostas à todas as perguntas.”
Todos os
visitantes sentiam uma mudança interior depois de conhecer Ramana, reconhecendo
como um momento decisivo em suas vidas. U.G. Krishnamurti, então com 21 anos de
idade, conheceu Ramana no ano de 1939, e perguntou a ele: “Esse algo chamado de
emancipação, iluminação, liberdade e liberação, você pode dá-lo para mim?” Ao
que Ramana Maharshi supostamente respondeu, eu posso dar, mas você pode pegá-lo?”
Esta resposta alterou completamente as percepções de U.G. sobre o caminho
espiritual e seus praticantes, e nunca mais procurou o conselho de pessoas
religiosas. Mais tarde U.G. diria que a resposta de Maharshi - que ele havia
originalmente percebido como arrogante, o colocou de volta no caminho,
afirmando depois que Ramana era um verdadeiro mestre.
Mahatma Gandhi
aconselhava as pessoas, em busca de paz, a visitar o Ashram de Ramana. Ele
mesmo, orientou Rajendra Prasad (o primeiro presidente da Índia) que por algum
tempo desejou ficar longe da vida agitada pela liberdade da tirania inglesa,
disse: “se você quer paz, vá para o Ashram de Ramana e permaneça por alguns
dias na presença dele, sem falar ou fazer qualquer pergunta”. Rajendra Prasad
obedeceu e passou alguns dias sob a sombra benigna de Ramana. No dia de sua
partida, enquanto se despedia do vidente, disse-lhe que tinha vindo aconselhado
por Mahatma Gandhi e agora estava voltando e pediu a Ramana que lhe desse uma
mensagem a ser entregue a Mahatma Gandhi. A isso, Ramana respondeu: “O mesmo
Poder que atua aqui está atuando lá também! Onde está a necessidade de palavras
quando o coração fala ao coração?” Ramana tinha grande estima por Mahatma
Gandhi e apoiava o movimento de independência liderado por ele, pois
considerava Gandhi uma figura comprometida com a causa divina, e que ficou
muito perturbado ao ouvir a notícia do assassinato de Gandhi. Com a morte de
Gandhi, ele consolou a si mesmo e a sua audiência narrando o episódio do
diálogo entre o deus da morte (Yama) e o maior deus do hinduísmo (Rama), num
dos maiores épicos antigos da literatura mundial, o (Uttara Ramayana). Nesta
narrativa, após Ramarajya (o reino védico perfeito) ser estabelecido, Yama diz
a Rama que a obra para o qual Gandhi havia vindo à terra havia sido concluída e
que era hora de ele retornar ao céu. Tomando essa narrativa como ilustração,
Ramana disse: “Isso é o mesmo que a liberdade ser obtida; seu trabalho acabou;
por que você ainda está aqui? Você não deveria voltar?”.
Quando do
sofrimento dos devotos em saber que Ramana estava enfrentando um tumor
cancerígeno, ele, que era indiferente à dor, os confortou dizendo: “Eles levam
este corpo como sendo o Supremo Ser e atribuem sofrimento a ele. Que pena! Eles
estão desanimados porque este corpo vai deixá-los, mas para onde ele vai e
como?” Lhes assegurando que: “Eu estarei onde estou sempre.” Ramana deixou o
corpo sentado em posição de lótus, e a palavra final que saiu de seus lábios
foi a sagrada sílaba OM! Uma vida efêmera que começou no dia 30 de dezembro de
1879, para a vida eterna e imortal aos 71 anos de idade às 20h47 em 14 de
abril, 1950.
Milhões de
indianos continuam a ver Ramana como a “fonte de autenticação do hinduísmo no
mundo moderno; um sábio sem o menor toque de mundanismo, um santo de pureza
incomparável, uma testemunha da verdade eterna dos Vedas; um sábio que atua
como um símbolo que continua a inspirá-los a preservar sua cultura e identidade
nacionais; um sábio cujos ensinamentos têm um ar atemporal, uma estrutura
clássica que parece tão apropriada para o hinduísmo do século XX quanto para o
hinduísmo do primeiro século”.