Wednesday 10 November 2021

FATORES EVOLUTIVOS E ANTI-EVOLUTIVOS DO HOMEM

Em toda a natureza não humana, ocorre o processo de evolução que foi estabelecido criteriosamente pelas Leis Cósmicas.

No homem, porém, existe a possibilidade de uma evolução espontânea e livre; só ele pode evolver ou não evolver, consoante o poder creador do livre arbítrio nele existente. Só o homem é responsável por sua evolução, não necessariamente do seu corpo biológico, corpo que ele tem em comum com os demais seres da natureza, mas do seu Ser tipicamente hominal, de sua alma.

Esse processo de evolução hominal consiste fundamentalmente numa harmonização do seu querer humano com o seu dever divino. O querer é da sua periferia ego; o dever é do seu Eu central.

A Bhagavad Gita diz que o ego é o pior inimigo do Eu, mas que o Eu é o melhor amigo do ego.

Da inimizade do ego não há evolução para o Eu, mas da amizade do Eu há possibilidade de evolução para o ego inimigo. O Eu pode integrar em si o ego, de maneira que haja harmonia entre esses dois polos da natureza humana, fazendo surgir o homem integral.

Como pode o Eu amigo integrar em si o ego hostil? Como estabelecer esta harmonia... como sintetizar pacificamente essas antíteses?

Somente pela atuação da verdade libertadora.

Como pode o Eu sapiente fazer com que o ego insipiente enxergue a verdade de que a essência do ego é essencialmente idêntica à essência do Eu?

Diretamente, o Eu amigo não pode converter o ego hostil, no entanto, indiretamente isso é possível.

Se o Eu chegar à plenitude da consciência da verdade sobre si mesmo (“Eu e o Pai somos um”) então acontecerá uma estranha osmose, um transbordamento do Eu para o ego.

E essa penetração osmótica, esse transbordamento da plenitude do Eu beneficiará o ego. Quando um único homem, diz Mahatma Gandhi, chega à plenitude do amor, ele neutraliza o ódio de milhões.

Quando o Eu chega à plenitude da sua consciência divina, da sua essencial identidade com o Infinito, neutralizará a inimizade do ego – e com isto está aberta a porta para a harmonização entre esses dois polos da natureza humana, ou seja, a solução definitiva está na mística do Eu. Esta mística do Eu produzirá paulatinamente a ética do ego, a plenitude do Eu transbordará em benefício do ego.

Para que este transbordamento seja recebido pelo ego, este deve tornar-se receptivo, que é a ética pré-mística do ego, e sempre dolorosa, é o “caminho estreito e porta apertada que conduzem ao Reino de Deus”. E, enfrentar a dor desta ética pré-mística cria abertura para receber o transbordamento da plenitude do Eu.

Sem este sacrifício inicial não há harmonização da natureza humana. Este sacrifício é um “fazer a coisa sacra”; que abre a porta para a realização do homem.

No princípio, este feito sacro é doloroso, mas no fim se torna “jugo suave e peso leve” – e então o homem achará repouso para a sua alma.

Mas como esse ego não receptivo se tornará um ego receptivo?

Só pela perfeita plenificação do Eu! E de todos os demais indivíduos da raça humana, de maneira que a salvação está em que muitos homens individuais cheguem à sua plenitude espiritual.

Esses muitos serão sempre poucos, pouquíssimos, em comparação com os bilhões de egos profanos.

O certo é que a qualidade atua sobre a quantidade, que a elite atua sobre a massa, desde que haja uma elite poderosa, plenamente consciente da verdade do seu Ser, e que essa consciência do Ser se manifeste na vivência do agir.

Um pouco de fermento leveda três medidas de farinha, diz Jesus; um Eu 100% realizado leveda e transforma as três massas da natureza do ego, isto é, a natureza física, mental e emocional.

Esta osmose, esta indução vital do Eu para o ego é infalível, suposto que o Eu já tenha permeado totalmente a sua própria existência.

Se não existir essa plenitude do Ser, é inútil todo o dizer e todo o fazer.

O problema da salvação da humanidade está na plena realização do homem. Sem auto-realização individual não há salvação social.

                                                       * * *

Há nos livros sacros duas séries de terríveis maldições ao homem; a primeira foi lançada pelas Forças da Creação, no Gênesis; a segunda por Jesus, no Evangelho.

No Gênesis as fulminantes maldições se dirigem contra a luxúria; no Evangelho, contra a ganância, permitindo admitir que a luxúria e a ganância sejam os maiores obstáculos à evolução ao homem, que frustram a razão-de-ser do seu advento e sua redenção.

Depois que a serpente (inteligência) sugeriu a explosão da libido como um fim autônomo, e não como um meio, essas Forças disseram o seguinte: “Porque fizeste isso, rastejarás sobre o teu ventre e teu peito e comerás do pó da terra, todos os dias da tua vida”.

Logo depois, essas mesmas Forças lançam uma maldição à mulher, que obedecera à sugestão da serpente: “Em dores darás à luz os teus filhos e terás muitos incômodos com a gravidez. E estarás sob o domínio do homem”.

Sobre o homem, foi então lançada esta maldição: “Seja maldita a terra por tua causa; se a cultivares, ela te produzirá espinhos e abrolhos, e no suor do teu rosto comerás o teu pão”.

Essas maldições são auto maldições do próprio homem; são as consequências inevitáveis da tirania da inteligência sobre a razão; são a derrota do Eu pelo ego. O homem se maldiz a si mesmo quando não harmoniza a sua consciência individual com a consciência universal; quando não realiza a razão-de-ser da sua encarnação terrestre.

No Evangelho, as maldições visam, de preferência, a ganância, como obstáculo à evolução ascensional do homem. “Ai de vós que sois ricos!... Mais fácil é passar um camelo pelo fundo de uma agulha do que um rico entrar no reino dos céus... Não podeis servir a Deus e às riquezas”.

Duas parábolas do Evangelho visam diretamente os gananciosos: a do ricaço que mandou ampliar os seus armazéns para abrigar os frutos duma safra extraordinária, e logo depois morreu.

A outra parábola é a do rico avarento, que se banqueteava esplendidamente todos os dias, e deixou morrer de fome o pobre Lázaro, à entrada do seu palacete. Logo depois foi sepultado no inferno, onde não conseguiu sequer uma gota de água para aliviar os seus tormentos.

Por que essas estranhas maldições à luxúria e à ganância?

Porque esses dois vícios invertem as Leis Cósmicas, deturpam a própria constituição do Universo e da natureza humana, quando usam os meios como fins em vez de usar os meios como meios para alcançar um fim superior. O escravo da luxúria se serve da libido como de um ídolo e como a suprema razão-de-ser da sua existência terrestre. Nos tempos atuais, a serpente da inteligência conseguiu isolar totalmente da procriação a libido inventando meios artificiais e outros expedientes para facilitar a luxúria como um fim autônomo, e causando mais deturpação.

Quanto à ganância, o homem moderno trabalha intensamente por muitos decênios, unicamente para amontoar grandes quantidades do “excremento de satanás” como o filósofo italiano, Giovanni Papini, apelidou o dinheiro. As grandes indústrias exploram milhões de escravos humanos para dar uma vida de super conforto à pequenos grupos de ricos exploradores.

Em síntese: As energias da libido e a propriedade material são usadas como fins autônomos. Os autores desses vícios entram em conflito com as Leis Cósmicas, usando os meios para fins diametralmente opostos aos fins visados pelas leis naturais.

Deste modo, os que usam desses expedientes, falsificam criminosamente as sagradas Leis do Universo e impossibilitam a evolução do homem.

As maldições do Gênesis e do Evangelho, são auto maldições. Não são as Forças Creadoras nem o Cristo Jesus que maldizem os escravos da luxúria e da ganância; é o próprio homem que se auto flagela. Toda a culpa gera sofrimento; a culpa e a consequente pena, são fatores correlativos e inseparavelmente unidos.

A Bhagavad Gita enumera cinco disciplinas como éticas pré-místicas de auto-realização, a saber: não violência, verdade, não furtar, desapego e disciplina sexual.  

As duas últimas disciplinas da filosofia oriental são idênticas às do Gênesis e do Evangelho: a falta de desapego dos bens materiais, e a falta de disciplina sexual são considerados por todos os livros sacros como os grandes obstáculos à evolução ascensional ou auto-realização do homem.

Texto extraído do livro O HOMEM

No comments:

Post a Comment