Saturday 6 November 2021

EVOLUÇÃO DO SER ATRAVÉS DO SOFRIMENTO

O sofrimento é uma ocorrência em todos os setores das existências finitas.

À primeira vista, parece ser um paradoxo, e não falta quem atribua o sofrimento como um argumento contra a existência de um poder creador, a Tese Absoluta, Deus, o Poder Infinito.

Se o mundo dos seres finitos, fosse um estado estático, e não um processo dinâmico, seria incompreensível o fenômeno do sofrimento dessas existências.

Mas o mundo dos seres finitos, como escreveu Albert Einstein, é o mundo da relatividade Universal. Tudo é um fluídico movimento permanente para o ser finito, onde nada é rígido. E, se existe um ser estático, esse é o Poder Infinito.

O paradoxo do sofrimento, no mundo das existências finitas, é a maior das verdades, porque é o processo de evolução, e nele ocorrem dois fenômenos, o do sofrimento-débito e o sofrimento-crédito, que não podem ser confundidos, pois o primeiro é doentio, resultado da culpa, do erro, e o segundo é sadio, pois é a afirmação voluntária do processo para maior ascensão espiritual.

Ocorre que se não houvesse sofrimento no mundo dos seres vivos, não haveria garantia para a conservação da vida, espécie e sua integridade. No sofrimento, a dor, é o grande protetor da vida e da integridade dos seres. Toda a vez que um organismo é lesado de alguma forma, surge o alerta da dor, para que o ser vivo tome as providências necessárias para evitar futuras lesões.

O próprio roteiro da evolução também é uma espécie de sofrimento, porque é um roteiro ascensional, e toda a ascensão envolve sofrimento, sofrimento sadio, sofrimento crédito.

Se não houvesse sofrimento, sofrimento que protege e sofrimento que faz evoluir, não se sabe o que seria do mundo dos seres vivos.

No mundo do ser humano, aparecem a consciência e livre-arbítrio, que são portas abertas para uma evolução ilimitada, mas que é inseparável do fenômeno do sofrimento, do sofrimento voluntário, do sofrimento crédito, que também se pode denominar como sofrimento metafísico. Quanto mais o homem evolve rumo às alturas da consciência espiritual, tanto mais percebe seu processo de evolução. Somente o homem de pouca consciência nesse setor evolutivo pode estar satisfeito com o seu estado, sem sentir a feliz insatisfação de uma possibilidade superior, pois a infeliz satisfação consigo mesmo mantém esse homem de pouca consciência num nível de estagnação.

Mas, quanto mais o homem sobe tanto mais sente a feliz insatisfação com o seu nível atual, e aumentando ainda o seu anseio rumo à um nível superior. O seu processo evolucional cresce na razão direta da sua evolução.

Num surto evolutivo mais radical, o homem entra, não propriamente numa feliz satisfação, como seria de esperar, mas num gozo sofrido, numa felicidade ao mesmo tempo feliz e insatisfeita; feliz, por estar na linha reta do seu destino; insatisfeito, porque a consciência da sua distância do Infinito se torna cada vez mais nítida e intensa.

Se a vida eterna fosse um céu de pleno gozo, não seria uma evolução superior. Mas o céu do homem de consciência espiritual é ao mesmo tempo um céu de gozo e um céu de sofrimento, de uma felicidade insatisfeita.

Quanto mais um homem possui a Deus, tanto mais vai em busca dele – e esse possuir e buscar incessante, é a sua vida eterna, a sua eterna felicidade; não uma vida estática, mas uma vida dinâmica.

Diz a matemática com sabedoria que: a distância entre qualquer finito e o Infinito é sempre infinita.

Essa busca do Infinito e a retidão de caráter são os dois polos sobre os quais gira toda a evolução do homem: um céu deliciosamente sofrido e dolorosamente gozado.

É sabido que todas as entidades de elevada evolução espiritual, descem a regiões inferiores a fim de poderem evolver mais e mais. Segundo Paulo de Tarso, ele atribui essa descida a Jesus, que, pelo fato da sua encarnação terrestre num ambiente de baixa vibração espiritual, e depois de seus sofrimentos voluntários, “entrou em sua glória”, numa glória evolutiva maior do que possuía antes.

Esse querer evoluir ainda mais nada tem que ver com egoísmo, como pensam os inexperientes, mas é o destino de toda a creatura creadora, é a razão-de-ser da sua própria existência.

Nem é conveniente atribuir essa descida ao desejo de ajudar outras creaturas existentes em planos inferiores. Esses espíritos não descem para fins de redenção externa. Podem e devem contribuir com sua mensagem de redenção, mas desceram para sua própria redenção, para sua autorredenção futura, ou seja, para uma maior autorrealização. É que todo aquele que ama verdadeiramente seu semelhante, ama a si mesmo, que é o auto amor: amar seu semelhante como a si mesmo, é a sabedoria de todos os mestres da humanidade, quem não tem auto amor nada pode amar.

Esses espíritos iluminados, descem a regiões inferiores a fim de encontrarem a devida resistência indispensável para uma próxima evolução. Mas, como toda a plenitude necessariamente transborda, essa plenificação da evolução desses espíritos, redunda em benefício de seres inferiores – suposto que estes tenham abertura ou receptividade para receber esse transbordamento de luz espiritual, do conhecimento metafísico.

Ocorre que muitos desses seres inferiores, no meio dos quais aparece um ser iluminado, não têm essa abertura receptiva – e esses seres sentem então a presença desse ser como uma ofensa, um desaforo, um desafio, e o hostilizam de todos os modos. Dificilmente, um pigmeu tolera ser eclipsado pela sombra de um gigante, como aconteceu com gênio cósmico que foi Jesus, crucificado, morto e sepultado pelos pigmeus da incompreensão.

Nesta altura, o sofrimento se torna decididamente positivo, tanto para o sofredor como para os receptores do transbordamento, mas estes, que terão que ressarcir esse transbordamento, através do sofrimento-débito, pois nada fizeram para reverter o aniquilamento do sofredor positivo.

Tão grande é esse mistério que em mais de 2000 anos de cristianismo não se compreende ainda, a verdadeira razão da encarnação do Cristo na pessoa humana de Jesus. 

Quanto mais liberto se acha um ser altamente iluminado, tanto mais ele se escraviza voluntariamente a fim de se libertar cada vez mais, galgando mais alto o seu céu. Somente os pouco libertos evitam a escravização voluntária, porque ainda não conseguiram soletrar o abc da evolução e autolibertação.

Para os seres de elevada evolução, o sofrimento voluntário é um “jugo suave e peso leve” e não mais um “caminho estreito e porta apertada”, como é para os recém-alfabetizados, ou para os analfabetos da evolução ascensional.

No princípio, o ego humano é um analfabeto nessa experiência; não anda sequer pelo caminho estreito e pela porta apertada, como faz o homem virtuoso, de um ego ligeiramente alfabetizado.

O homem de elevada evolução espiritual não é vicioso, nem virtuoso, mas sábio. Já não se vinga de ofensas, como o analfabeto, nem as perdoa, como o recém alfabetizado ou virtuoso – mas simplesmente ignora qualquer ofensa. O fator ofensa é do ego, vicioso ou virtuoso; o ignorar a ofensa é do Eu da sabedoria.

Quem ainda se encontra no nível horizontal do ego é como a água, que pode tornar-se impura; mas quem está no nível vertical do Eu é como a luz, que é absolutamente incontaminável por qualquer impureza, e nem permite o acesso à ofensa.

Texto revisado extraído do livro O HOMEM 

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