Saturday 26 June 2021

A CONFISSÃO DO ERRO É O INÍCIO DA VERDADE

Em 1944, após completar 25 anos de apostolado sacerdotal e literário a serviço da igreja católica, o Professor Rohden entregou para a maior autoridade eclesiástica no Brasil, um documento demitindo-se de suas funções devido a intensas e constantes calunias que sofreu - algumas bastante agressivas - por parte do clero local e estrangeiro, e principalmente da proibição da circulação de alguns de seus livros, que serviam unicamente para divulgar a mística e a ética do Evangelho de Jesus e seus ensinamentos e não ao Evangelho do clero, porque Rohden “chamava branco o que era branco, e preto o que era preto, coisa perigosa no meio de uma sociedade religiosa obscura e furta-cor.”

O texto abaixo mostra parte das críticas que Rohden abertamente fez a alguns segmentos do clero romano, fazendo publicar seu descontentamento e ideias nos dois volumes de sua autobiografia em 1962.

“No tempo em que Jesus peregrinava pelas terras da Palestina, encontrou apenas uma classe de inimigos mortais: os ritualistas da sinagoga, que não descansaram até o verem suspenso na cruz. Excomungaram como não religioso o homem mais religioso que a humanidade conhece!... A parábola do bom samaritano é a mais tremenda condenação dessa plenitude ritual e vacuidade espiritual dos membros do clero judeu. O samaritano, vil herege e excomungado pelos “santos” da sinagoga e canonizado por Jesus como o tipo autêntico do homem verdadeiramente religioso, porque ele era profundamente ético e espiritual, apesar de nada eclesiástico no parecer dos sacerdotes e levitas da igreja de Israel, tanto é que Jesus propõe ser esse samaritano um modelo a ser imitado, incitando a todos com a sua conhecida frase: “Vai e faze tu o mesmo!”

Os ritualismos externos, como a execução e cumprimento exato de certas práticas, dogmas, reverências, obediência de regras, observâncias, posturas, etc., quando tomados isoladamente como sendo religião, endurecem e insensibilizam a consciência ética e espiritual, tornando o homem inacessível ao real espírito da Verdade. É em geral mais fácil converter um materialista bruto do que um refinado seguidor de ritualismos: aquele é terreno não cultivado e vazio, este é edifício mal construído e contaminado, e que deve ser demolido antes de se iniciar a estrutura espiritual do reino da Verdade.

Se o clero romano tivesse a humildade e sinceridade de compreender e aceitar que a força real do Cristianismo não está em certas práticas litúrgicas que ele introduziu na igreja no decorrer dos séculos, mas sim na completa assimilação do espírito do Cristo, assim como brilha no Evangelho, é certo que o catolicismo eticamente impotente dos nossos dias voltaria a ser a poderosa Catolicidade que foi nos primeiros séculos. Mas entre a fraqueza do catolicismo romano e a força da Catolicidade cristã, existe um enorme abismo. Para construir uma ponte sobre esse abismo, a hierarquia romana devia, antes de tudo, abandonar as suas tendências políticas e diplomáticas e ocupar-se com os interesses propriamente éticos e espirituais de seus seguidores; e, depois disto, substituir a teologia de seus padres pelo Evangelho do Cristo, uma vez que a força regeneradora para o indivíduo e a sociedade está na palavra de Deus e não nas especulações dos homens.

A confissão do erro é o início da verdade.

Mas essa humilde sinceridade não existe na hierarquia eclesiástica como tal, embora exista em determinados indivíduos que, a despeito da moldura teológica, se guiam pelo espírito do Evangelho. Em vez de reconhecer o seu erro - e assim debilitar o seu prestígio político - a igreja excomunga todos aqueles que tem a ousadia de lhe apontar o quanto se desviou da Catolicidade.”

Texto revisado, extraído do livro Por Um Ideal, volume I, págs. 104 e 105 

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