Todo ser humano, consciente ou inconscientemente, querendo ou não, cedo ou tarde, descobre na sua essência, a verdade de que ele faz parte de algo transcendente, que ele é, aparentemente, a única creatura com a habilidade superior de poder refletir sobre si mesmo, de sua origem, de se ligar a alguma crença que possa de alguma forma aliviar seus dramas e dilemas da existência, e que eventualmente, descobre seu lado espiritual, que faz parte integrante de sua memória astral. Mas o maior dos problemas da vida humana não é, propriamente, o contato consciente com o mundo espiritual. O problema está em como manter acesa a consciência espiritual no meio das materialidades do mundo cotidiano.
Depois de estabelecer o contato consciente com o Eu divino, o homem deve regressar à sua vida normal, em todos os campos, trabalhando em qualquer setor honesto da vida humana - a não ser que seja outra a sua missão peculiar.
Esse regresso, porém, é meramente externo, funcional; internamente, experiencialmente, continua o homem a viver no “reino dos céus”, na sua consciência crística, refletida na célebre frase de sabedoria de Jesus: “eu e o Pai somos um.”
Mahatma Gandhi, quando convidado para se isolar numa caverna para manter a sua espiritualidade, respondeu que ele trazia dentro de si essa caverna sagrada. Todo homem deve ter, dentro de si, o seu céu portátil, mesmo em pleno inferno do mundo profano. Sua alma deve ser uma Vestal Virgem a alimentar o fogo sagrado no altar da Divindade.
Para que o regresso ao mundo das coisas profanas possa ser realizado sem detrimento da sacralidade interior, é necessário que o homem esteja firmemente consolidado na experiência do seu centro divino, que é a compreensão experiencial da verdade sobre si mesmo, a consciência inabalável de que a última e mais profunda Realidade do homem é Deus, o Infinito, o Eterno, de onde ele migrou para as experiências terrenas e para onde deve voltar, se quiser cumprir sua missão no processo evolutivo universal ou se desintegrar no éter.
“Vós sois Deuses” - estas palavras de Jesus, revelam a verdade sobre a natureza humana. Quando os seus inimigos o acusavam de pretender ser Deus, ele não negou que era Deus, mas afirmou que eles também eram Deuses. “Deus” quer dizer uma manifestação individual da Divindade Universal, pois toda creatura humana é uma manifestação individual finita, da Divindade Universal Infinita. Nenhuma creatura é a Divindade, mas toda creatura é Deus, isto é, uma emanação da Divindade. O homem é um Deus consciente, reflexo individual da Divindade Oniconsciente.
Infelizmente, a tradição teológica das igrejas destruiu no homem, a consciência de que “eu e o Pai somos um”. Na teologia dos clérigos, se ensinou que o homem é mau, pecador, filho do diabo, etc. É que a vasta maioria dos chamados “mestres espirituais” continuam sendo “guias cegos guiando outros cegos”, pois identificam o homem com o seu ego negativo, e não com o seu Eu positivo; aprenderam no Gênesis que o homem é “pó” - mas não leram no Evangelho que o homem é “luz”, “espírito”, “Deus”. Esses mestres espirituais são ótimos discípulos da escola primária de Moisés, porém nunca se matricularam na Universidade do Cristo. “Por Moisés foi dada a lei; pelo Cristo veio a verdade, veio a graça”. Lei é escravidão - verdade e graça são liberdade. Lei é ego - verdade e graça são o Eu.
Enquanto o homem conhece apenas a lei escravizante do seu ego tirânico, não pode viver livre no meio dos escravos, puro, no meio dos impuros, e que fará bem em tentar viver longe dos impuros, livre, longe dos escravos, sacro, longe dos profanos. Mas, se algum dia descobrir a verdade libertadora sobre si mesmo; se descobrir o seu Eu divino, ultrapassará todas as leis da escravidão e ingressará na zona da verdade libertadora. E assim, plenamente liberto, poderá viver no meio dos escravos sem perder a sua liberdade. Levará consigo a sua beatitude espiritual - a plenitude da extinção de sua individualidade - no meio de todas as ilusões materiais. Se pode ou não conseguir esse intento, isto depende do nível da sua consciência, do grau de intensidade com que ele experimentou a verdade libertadora sobre si mesmo.
A linguagem de cada dia revela o estado de consciência da maioria da humanidade. Quando o homem diz “eu estou doente”, ou “eu sou inteligente”, ou ainda “eu fui ofendido”, identifica-se com o seu ego, esquecido do seu Eu, que não pode estar doente, que não é apenas inteligente, que não pode ser ofendido.
Há milhares de anos que a humanidade vive na ilusão de se identificar com o seu ego periférico, e devido a isso, fica difícil ao homem romper as algemas tradicionais, e habituar-se à verdade libertadora de que ele é, realmente, o seu Eu, a sua alma, o espírito de Deus que nele habita, e não o seu ego.
É necessário que o homem se liberte dessa hipnose coletiva, dessa ilusão de se identificar com o seu ego periférico, que Jesus chama “o dominador deste mundo, que é o poder das trevas, e que tem poder sobre vós”.
Para conquistar esse “tesouro oculto” e realizar a “única coisa necessária”, é indispensável que o homem pratique frequentemente, o exercício de “dissociação” do seu ego, a fim de poder ouvir a voz do Eu, que só se manifesta em profundo silêncio.
O ego vive no ruído.
O Eu habita no silêncio.
É necessário que se reserve para esse silêncio, uma parcela das 24 horas de cada dia. O mundo chamado civilizado, costuma ditar ao homem 8 horas para o trabalho, 8 horas para o sono e 8 para o descanso e divertimentos. É evidente que com semelhante programa, sob a ditadura dos sistemas materialistas, o homem continuará a marcar passo a vida inteira e não sairá jamais desse círculo vicioso tradicional.
Pouco é o tempo necessário para que o homem adquira um início de experiência espiritual, para penetrar em sua “caverna interior”, mas é indispensável que faça esse exercício de interiorização num local onde não seja perturbado. Os ruídos da natureza - do mar, dos ventos, dos pássaros, etc., uma música suave e que convide à concentração e não perturbe o silêncio; mas qualquer voz humana causa perturbadora interferência. E, num estágio mais avançado, é suficiente ouvir apenas a música cósmica do Universo.
Muito se diz e se escreve sobre respiração e postura corporal. Quem folheia certos livros sobre tais assuntos, talvez saia totalmente desanimado.
O controle da respiração e sua rítmica ajuda a estabelecer pureza e harmonia de vibrações vitais e mentais. Mas esse exercício de controlar a vibração ou energia que ativa e sustenta a vida no corpo – de desconectar a mente das funções corporais e percepções sensoriais - deve preceder, e não acompanhar esse momento de interiorização. Durante o período de profunda concentração, a respiração se torna inconsciente, diminuindo gradualmente, na razão direta da concentração. No auge da profunda meditação ou contemplação, quando o homem entra no “terceiro céu”, ou êxtase divino, a respiração é tão imperceptível que parece não existir mais.
Quanto à postura corporal, há grandes aberrações e arbitrariedades. O oriental está habituado, desde pequeno, a sentar-se de pernas cruzadas (posição de lótus), postura que é normal e indolor. Mas, o ocidental adulto raramente alcança essa naturalidade de posição que lhe faça esquecer a presença de seu corpo. E, enquanto a postura causar qualquer incomodo, não deve ser adotada, porque é necessário que durante a interiorização, o homem ignore inteiramente a realidade de seu ego físico, a fim de se deixar absorver totalmente pelo Eu espiritual.
Somente quem atingiu o auge da meditação espiritual profunda, e se habituou a viver nela como em seu ambiente natural, é que pode, sem perigo, regressar ao mundo das escravidões sem sucumbir à escravidão anterior. Uma vez que conheceu a verdade sobre si mesmo, está a tal ponto liberto de todas as inverdades do ego, que pode viver puro, no meio de impuros, livre, no meio de escravos, porque a consciência de ser a “luz do mundo”, lhe conferiu definitiva imunidade. A luz é a única realidade incontaminável; pode penetrar todas as impurezas sem se tornar impura.
Texto revisado e ampliado, extraído em parte, do livro Rumo à Consciência Cósmica
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