Friday 26 February 2021

A DELINQUÊNCIA JUVENIL É FRUTO DE UMA FALSA EDUCAÇÃO

O ser humano não necessita de eruditos para instruir seus educandos. O que ele necessita é de educadores de caráter que, com a sua própria vida e vivência ética, deem a seus educandos o exemplo da dignidade do homem, pois o verdadeiro sentido da educação é intensificar a consciência, e esse educador deve ter realizado em si os seus mais profundos valores humanos; só assim poderá servir de guia e mentor a outros, não tanto pelo que diz ou faz, mas sobretudo pelo que esse educador é.

Já se foi o tempo em que se dizia ingenuamente: "Abrir uma escola é fechar uma cadeia", e a experiência da realidade prova que os grandes malfeitores da humanidade não foram analfabetos, mas, sim, homens que não educaram a consciência. Muitos delinquentes em nossos dias, exibindo títulos universitários, estão à frente de governos em todos os sistemas políticos. Inclusive a vasta maioria dos políticos – também diplomados - estão mancomunados com seus partidos, com suas divisões, agindo como delinquentes mafiosos que buscam apenas satisfazer o apetite ganancioso de seus asseclas que estão em parlamentos espalhados pelo mundo, a serviço de um sistema cuja natureza é de delinquência.

O verdadeiro sentido da educação é intensificar a consciência, mas os governos não estão interessados nesse processo de conscientização. O interesse maior é na instrução.

Para que alguém seja um verdadeiro educador não basta estudar a psicologia periférica e superficial que vem exposta na maior parte dos livros sobre educação – é necessário que desça aos mais profundos abismos de seu próprio Eu, entrando em contato direto com o alicerce cósmico da sua natureza humana, daquilo que ele “é”, e consciente dessa sua realidade, caso contrário a humanidade vai continuar na retaguarda do processo educacional e continuamente enfrentando os dramas e dilemas de uma sociedade ignorante de si mesma.

Kurt Gauger (1899-1959), médico, psiquiatra e filósofo germânico, escreveu o livro “Daemon-Stadt”, que poderíamos traduzir como Estado Demoníaco, obra em que o autor, diante de abundantes fatos da época, estudou o alarmante problema da delinquência juvenil, e até infantil, na Alemanha e em outros países, no período que seguiu às duas guerras mundiais.

No livro, ele chegou à conclusão de que a presente geração, produto de gerações anteriores e herdeira de ideologias funestas, perdeu a noção da responsabilidade ética, porque perdeu a noção de ser parte integrante do grande TODO, seja o TODO imediato da humanidade, seja o TODO longínquo do Universo como tal. Entre outros assuntos, ele relata a entrevista com uma criança de 12 anos que mata seu pai com um tiro de revólver; interrogada pelo motivo do crime, responde cinicamente: “Matei porque quis”, dizendo não ter o menor remorso do seu ato porque toda pessoa tem o direito de fazer aquilo que acha interessante.

O homem que perde a visão de um TODO maior no Universo, do qual ele faz parte e que tem que respeitar, perde necessariamente a noção da ética, da obrigação, do dever moral, porque a noção da ética se baseia na consciência de que eu sou parte de um TODO, e que eu tenho certas obrigações naturais e inevitáveis para com o TODO, que tem direitos reais sobre mim.

Como se vê, o problema da criminalidade em todos os tempos afeta o problema da ética, que tem suas raízes no problema da metafísica, ou da questão da íntima natureza humana: “Que é o homem? De onde vem? Para onde vai? Por que está aqui?”. Portanto, não é possível dar base sólida à ética sem responder, satisfatoriamente, a essas perguntas fundamentais da vida.

No citado livro, ele reproduz a impressionante carta de um jovem delinquente condenado a 20 anos de reclusão que escreve uma espécie de exame de consciência para os “homens honestos” do mundo.

Diz o jovem ofensor:

Por que vocês são homens fracos em fazer o bem, me deste o nome de homem forte em fazer o mal – e com isso condenam uma geração contra a qual vocês mesmos pecaram – porque vocês são fracos.

Pela minha pena de reclusão, concedi dois decênios para me fazer forte – forte no amor, forte na boa vontade – vocês, porém, me fizeram forte no mal, porque vocês são fracos no bem.

Não me indicaram nenhum caminho que tivesse sentido, porque vocês mesmos ignoram esse caminho e descuidaram de procura-lo – porque vocês são fracos. Vosso vacilante "não" assume atitude incerta diante das coisas proibidas; quando crianças, fruto de nossa ignorância, demos uns gritos – e vocês retiraram o vosso "não" e disseram "sim", a fim de poupar os seus nervos fracos. E a isto vocês chamam "amor".

Porque vocês são fracos, compraram de nós o vosso sossego. Quando éramos pequenos, nos davam dinheiro para irmos ao cinema ou para comprarmos sorvete; com isto vocês prestaram um serviço não a nós, mas à comodidade de vocês mesmos – porque vocês são fracos. Fracos no amor, fracos na paciência, fracos na esperança, fracos na fé.

Nós somos fortes no mal – mas as nossas almas têm apenas metade da vossa idade.

Nós nos rebelamos para que não tenhamos de chorar por todas aquelas coisas que deixastes de nos ensinar. Sabemos ler e contar; sabemos quantas pétalas há numa flor, sabemos como vivem as raposas e conhecemos as estruturas de uma planta – aprendemos a ter que calar a boca e ficar quietos nos bancos de escola – mas não nos ensinaram como enfrentar a vida.

Estamos até dispostos a crer em Deus, num Deus infinitamente forte que tudo compreendesse e de nós esperasse que fôssemos bons – mas não nos mostraram um só homem que fosse bom pelo fato de crer em Deus. Vocês ganharam muito dinheiro com serviços religiosos e murmuraram orações segundo a velha rotina.

--- Senhor Policial, deixa de lado seu armamento! Dize-nos antes o que nos interessa saber: é verdade que amas a ordem pública a que serves? Ou não será que amas acima de tudo o direito que tens ao teu salário e à tua aposentadoria?

--- Senhor Ministro da Educação! Mostra-nos se você é forte como homem! Quantas obras boas você pratica, como cristão, às ocultas?

Será que nós não somos as caricaturas da vossa existência toda feita de mentiras?

Nós, os delinquentes juvenis, somos desordeiros públicos e rebeldes – vocês, porém, lutam às ocultas, um contra os outros; se digladiam comercialmente e armam intrigas para conquistar posições mais rendosas.

Em vez de nos ameaçar com armas, nos coloque face a face com homens de verdade, que nos mostrem qual é o caminho certo, não com palavras, mas com a sua vida.

Mas vocês são fracos no bem! Os que são fortes no bem vão para a mata virgem e curam os negros da África – porque os fortes no bem desprezam os fracos no bem, porque vocês são fracos no bem – e nós somos fortes no mal. 1

Mamãe, vamos rezar! Porque esses homens fracos estão armados de pistolas!"

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1)- Referência feita à Albert Schweitzer.

Texto revisado, e em parte extraído do livro Novos Rumos para a Educação

LA DELINCUENCIA JUVENIL ES EL FRUTO DE UNA EDUCACIÓN FALSA

Los seres humanos no necesitan académicos para instruir a sus alumnos. Lo que necesitan son educadores de carácter que, con su propia vida y experiencia ética, den a sus alumnos el ejemplo de la dignidad del hombre, porque el verdadero significado de la educación es intensificar la conciencia, y este educador debe haberlo logrado en sí mismo sus valores humanos más profundos; solo entonces puede servir como guía y mentor para otros, no tanto por lo que dice o hace, sino sobre todo por lo que es ese educador.

El tiempo en que se decía ingenuamente: "Abrir una escuela es cerrar una cadena" se ha ido, y la experiencia de la realidad demuestra que los grandes malvados de la humanidad no eran analfabetos, sino, sí, hombres que no educaban la conciencia. Muchos criminales de hoy, que muestran títulos universitarios, están por delante de los gobiernos en todos los sistemas políticos. Incluso la gran mayoría de los políticos, también graduados, están aliados con sus partidos, con sus divisiones, actuando como delincuentes que solo buscan satisfacer el codicioso apetito de sus secuaces que están en parlamentos de todo el mundo, al servicio de un sistema cuya naturaleza es de delincuencia.

El verdadero significado de la educación es crear conciencia, pero los gobiernos no están interesados en este proceso de conciencia. El mayor interés está en la instrucción.

Para que alguien sea un verdadero educador, no es suficiente estudiar la psicología periférica y superficial que se expone en la mayoría de los libros sobre educación, es necesario descender a los abismos más profundos de su propio Yo esencial, entrar en contacto directo con los cósmicos cimientos de su naturaleza humana, de lo que "es", y consciente de su realidad, de lo contrario la humanidad continuará marcando un paso en el proceso educativo y enfrentando continuamente los dramas y dilemas de una sociedad ignorante de sí misma.

Kurt Gauger (1899-1959), médico, psiquiatra y filósofo alemán, escribió el libro "Daemon-Stadt", que podríamos traducir como el Estado Demoníaco, una obra en la que el autor, frente a abundantes hechos de la época, estudió el alarmante problema de la delincuencia juvenil, e incluso infantil, en Alemania y otros países, en el período que siguió a las dos guerras mundiales.

En el libro, concluyó que la generación actual, como producto de generaciones anteriores y heredera de ideologías desastrosas, ha perdido la noción de responsabilidad ética porque ha perdido la noción de ser parte integral del gran TODO del Universo como tal. Entre otros asuntos, informa sobre la entrevista con un niño de 12 años que mata a su padre con un revólver; interrogado por el motivo del crimen, él responde cínicamente: "Maté porque quería", diciendo que no tiene remordimiento por su acto porque todos tienen el derecho de hacer lo que le parezca interesante.

El hombre que pierde de vista un TODO mayor en el Universo, del cual es parte y que debe respetar, necesariamente pierde la noción de ética, de obligación, de deber moral, porque la noción de ética se basa en la conciencia de que yo soy parte de un TODO y tengo ciertas obligaciones naturales e inevitables con el TODO, que tiene derechos reales sobre mí.

Como resultado, el problema de la criminalidad en todos los tiempos afecta el problema de la ética, que tiene sus raíces en el problema de la metafísica, o la cuestión de la naturaleza humana íntima: “¿Qué es el hombre? ¿De dónde vienes? ¿Para dónde vas? ¿Por qué estás aquí? Por lo tanto, no es posible dar una base sólida a la ética sin responder satisfactoriamente a estas preguntas fundamentales de la vida.

En ese libro, el escritor reproduce la impresionante carta de un joven delincuente condenado a 20 años de prisión que escribe una especie de examen de conciencia para los "hombres honestos" del mundo.

El joven delincuente dice:

“Como ustedes son hombres que son débiles para hacer el bien, me han dado el nombre de un hombre que es fuerte para hacer el mal, y con eso condenan a una generación contra la cual pecaron ustedes mismos porque son débiles.

Por mi pena de prisión, di dos décadas para hacerme fuerte - fuerte en el amor, fuerte en la buena voluntad - ustedes, sin embargo, me hicieron fuerte en el mal, porque eres débil en el bien.

No me señalaron ningún camino que tuviera sentido, porque ustedes mismos ignoran ese camino y descuidan buscarlo, porque son débiles. Su vacilante "no" asume una actitud incierta hacia las cosas prohibidas; Cuando niños, como resultado de nuestra ignorancia, gritamos - y usted eliminó su "no" y dijo "sí" para evitar sus nervios débiles. Y a esto lo llamas "amor".

Debido a que eres débil, nos compraste tu paz. Cuando éramos pequeños, nos daban dinero para ir al cine o comprar helado; con esto nos han prestado un servicio no a nosotros, sino a la comodidad de ustedes mismos, porque son débiles. Débil en el amor, débil en la paciencia, débil en la esperanza, débil en la fe.

Somos fuertes en el mal, pero nuestras almas solo tienen la mitad de tu edad.

Nos rebelamos para no tener que llorar por todas esas cosas que no nos enseñaste. Sabemos leer y contar; sabemos cuántos pétalos hay en una flor, sabemos cómo viven los animales y conocemos las estructuras de una planta, aprendemos a tener que callarnos en los bancos de la escuela, pero no nos enseñaron cómo enfrentar la vida.

Incluso estamos dispuestos a creer en Dios, en un Dios infinitamente fuerte que entendió todo y esperaba que fuéramos buenos, pero no nos mostraron un solo hombre que fuera bueno porque creía en Dios. Ganaste mucho dinero con los servicios religiosos y murmuraste oraciones según la vieja rutina.

--- ¡Señor Policía, guarda sus armas a un lado! Díganos de antemano qué nos interesa saber: ¿es cierto que ama el orden público al que sirve? ¿O no amas tu derecho a tu salario y jubilación por encima de todo?

--- Señor Ministro de Educación! ¡Muéstranos si eres fuerte como hombre! ¿Cuántas buenas obras haces como cristiano en secreto?

¿No somos las caricaturas de tu existencia hechas de mentiras?

Nosotros, los delincuentes juveniles, somos vándalos y rebeldes públicos; ustedes, sin embargo, luchan en secreto unos contra otros; luchan entre sí comercialmente y crean intrigas para ganar posiciones más rentables.

En lugar de amenazarnos con armas, colóquenos cara a cara con hombres de verdad, que nos muestran el camino correcto, no con palabras, sino con sus vidas.

¡Pero eres débil en el bien! Los que son fuertes en bondad van a la selva virgen y sanan a los negros en África, porque los fuertes en el bien desprecian a los débiles en el bien, porque ustedes son débiles en el bien, y nosotros somos fuertes en el mal. 1

¡Mamá, oremos! ¡Porque estos hombres débiles están armados con pistolas!"

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1)- Referência a Albert Schweitzer          

JUVENILE DELINQUENCY IS THE RESULT OF A FALSE EDUCATION

Human beings do not need scholars to instruct their students. They need educators of character who, with their own life and the ethical experience set their students the example of the dignity of man, because the true meaning of education is to intensify consciousness and this an educator must have accomplished it in its deepest human values; only then can it serve as a guide and mentor to others, not so much for what it says or does, but above all for what that educator is.

The time when it was naively said: "To open a school is to close a jail" is long gone, and the experience of reality proves that the great evildoers of humanity were not illiterate, but men who did not educate their conscience. Many criminals today, displaying university degrees are ahead of governments in all political systems. Even the vast majority of politicians - also graduates - are in league with their parties, with their divisions, acting as criminal offenders who seek only to satisfy the greedy appetite of their minions who are in parliaments around the world, at the service of a system whose nature is of delinquency.

The real meaning of education is to raise conscience, but governments are not interested in this process. The greatest interest is in education.

For someone to be a true educator, it is not sufficient to study the peripheral and superficial psychology exposed in most books on education - it is necessary to descend into the deepest chasms of its own Self, coming into direct contact with the cosmic foundation of its human nature, of what it "is", and aware of its reality, otherwise, humanity will continue behind in the educational process and continually facing the dramas and dilemmas of a society ignorant of itself.

Kurt Gauger (1899-1959), German doctor, psychiatrist and philosopher wrote the book “Daemon-Stadt”, which we could translate as the Demonic State, a work in which the author, faced the abundant facts, the growth and the alarming problem of juvenile delinquency, and even infantile, in Germany and other countries, in the period that followed the two world wars.

In the book, he concluded that the present generation, as the product of previous generations and heir to disastrous ideologies have lost the notion of ethical responsibility because it has lost the notion of being an integral part of the great WHOLE of the Universe as such. Among other matters, he reports on the interview with a 12-year-old child who kills his father with a gunshot; interrogated for the motive of the crime, he replies cynically: “I killed because I wanted to”, saying that he has no remorse for his actions because everyone has the right to do what it finds interesting.

The man who loses the vision of a greater WHOLE of the Universe in which he is part and has to respect, necessarily loses the notion of ethics, of obligation, of moral duty, because the notion of ethics is based on the consciousness that I am part of the WHOLE, and that I have certain natural and unavoidable obligations to the WHOLE, which has real rights over me.

As can be seen, the problem of criminality at all times affects the problem of ethics, which has its roots in the problem of metaphysics, or the question of intimate human nature: “What is the man? Where does he come from? To where he goes? Why he is here?" Therefore, it is not possible to give a solid basis to ethics without satisfactorily answering these fundamental questions of life.

In that book, he reproduces the astounding letter from a young delinquent sentenced to 20 years in prison who writes a kind of examination of conscience for the "honest men" of the world.

Says the young offender:

"Because you are weak men in performing good deeds, you gave me the name of a strong man who does evil things - and thus condemn a generation against which you yourselves have sinned - because you are weak.

For my imprisonment, I have granted to myself two decades to make me strong - strong in love, strong in goodwill - you, however, made me strong as an evildoer, because you are weak in doing good.

You do not indicate to me any path that made sense, because you yourselves ignore this same path and neglected to search for it - because you are weak. Your wobbly "no" assume an uncertain attitude when facing forbidden things; as children, the result of our ignorance, we screamed - and you withdrew your "no" and said "yes" in order to save your weak nerves. And to this, you call "love".

Because you are weak, you bought from us your peace. When we were little, you gave us money to go to the movies or to buy an ice cream; with this, you provided a service, not to us, but the convenience of yourself - because you are weak. Weak in love, weak in patience, weak in hope, weak in faith.

According to you, we are strong evildoers - but our souls have only half your age.

We rebelled so we do not have to cry for all those things that you have failed to teach us. We know how to read and count; we know how many petals there are in a flower, we know how some animals live and we know the structure of a plant - we learn to have to shut up and sit still in school chairs - but you do not teach us how to face life.

We are even willing to believe in God, in a God infinitely powerful who everything comprehends and expected from us to be good - but you do not show to us a single man who was good because he believed in God. You have earned a lot of money with religious services and murmured prayers according to the old routine.

--- Police officer please, leave aside your weapons! Tell us instead what interests us to know: you indeed love the organization that you serve? Or do you love above all, the right you have to your salary and your future retirement?

--- Minister of Education! Show us if you are strong as a human being! How many good deeds do you practice, as a Christian, in secret?

Are we not the caricature of your entire existence made of lies?

We, the juvenile criminals, are public troublemakers and rebels - you, however, fight in secret, one against the other; commercially debating and organizing intrigues to win the most profitable positions.

Rather than threatening us with weapons, put us face to face with men of truth, to show us what is the right path, not with words but with their lives.

But you are weak in doing good! Those who are strong in doing good goes to the jungle to heal the wounds of the black people in Africa - because the strength in doing good despise the weak in doing good because you are weak in doing good - and we are strong evildoers. 1

Mom, let's pray! Because these weak men are armed with guns!"

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1)- Reference made to Albert Schweitzer.

 

TENHA ORGULHO DE SUAS CICATRIZES

Lições de uma louça quebrada, por Sean Buranahiran

 

Na cultura japonesa antiga, quando uma louça de porcelana que tem história, ou valor sentimental se quebra, ela deve ser reparada remendando as áreas quebradas com laca misturada com ouro em pó, criando assim uma nova obra de arte que visa restaurar a beleza do que foi quebrado.

É um método único conhecido como Kintsukuroi (reparo em ouro), que se baseia na falsa filosofia de que pessoas e objetos não podem ter beleza intrínseca ou que são inúteis quando quebrados; um princípio que não pode ser aceito, pois não oferece a oportunidade de reparos ou direção, tanto na existência de algo, como na existência de uma pessoa.

Diz-se que as origens dessa arte datam do período Muromachi, quando o Shogun, Ashikaga Yoshimitsu (1358-1408) quebrou sua tigela de chá favorita e, perturbado com o acontecimento, a mandou para ser reparada na China. Mas, ao retorno do objeto, ficou horrorizado com os ante estéticos grampos de metal que haviam sido usados para juntar as peças quebradas e encarregou seus artesãos de criar uma solução mais apropriada. O que eles criaram foi um método que não disfarçava o dano, mas fez da xicara, um objeto de arte.

Quando, em sentido figurado, se transfere essa ideia para os dramas e dilemas humanos, as cicatrizes das feridas podem apresentar diferentes formas e tamanhos. Algumas são visíveis no corpo, outras, emocionais, invisíveis, mas que não deixam de ter um impacto pessoal. Cobrindo essas feridas com o ouro da renovação, o homem dá sequência em sua vida, num novo horizonte de compreensão e aceitação. De tudo o que quebrou, ainda sobrou um pouco e, do que sobrou, pode-se fazer o melhor.

Este é um texto de um vídeo que encontrei por “acaso” há alguns anos atrás e me pareceu apropriado para todos os que passam pelas dificuldades da separação, ou de algo que se quebrou no íntimo de suas existências e pode servir como recurso ou reflexão para seguirmos em frente, deixando as algemas do passado, em liberdade, mesmo porque o passado já não mais existe dentro do contexto de tempo e espaço e não se pode ficar ruminando esses bocados do passado, que mais mal nos causam, e principalmente, fazendo-nos perder a noção do AGORA! No entanto, esse texto, não quer dizer que alivia a dor do rompimento desse algo, mas age como um bálsamo, como uma esperança de fé.


Segue abaixo, tradução do vídeo original e adaptação do texto em Português.

 

“Os japoneses acreditam que quando algo sofreu danos e tem uma história, esse dano deve ser reparado com ouro, tornando o objeto ainda mais bonito. E a mesma ideia deve valer para os seres humanos. Tudo o que passou em nossas vidas e criou história, causando danos, não deve tornar a nossa vida ainda mais triste, por mais que assim possa parecer. Cabe somente a nós reparar esses danos, na superação e revestindo-os com ouro afim de tornar nossa vida ainda mais alegre e atraente.

Ninguém está tão destruído a ponto de que não se possa ser reparado. Podemos ajuntar nossos pedaços, nos reconstruir e nos tornarmos melhores, aprendendo com os erros passados.

Devemos mostrar nossas cicatrizes orgulhosamente, como se essas cicatrizes fossem uma medalha de honra, e assim poder dizer: “Vejam o que eu passei, isso me fez quem sou eu hoje, que posso superar todos os problemas que eventualmente a vida coloca diante de mim.”

Aparentemente, ninguém viveu uma vida perfeita, e talvez nunca irá viver. Só cabe a nós apenas, a opção de restaura-la em ouro, tornando-a ainda mais atraente.

Não se envergonhe do que se passou. Tudo o que aconteceu, aconteceu por um motivo. Portanto, quanto mais negamos nossos erros, mais reclamamos e não aceitamos o que aconteceu, menos útil se tornam as dificuldades para nós mesmos. Rejeição é inferno, aceitação é céu! No momento em que aceitamos e descobrimos a utilidade dos erros, passamos a restaurar em ouro, aquilo que se partiu, transformando em beleza e inspiração a nós mesmos e aos outros. Tudo vale a pena e teve sua razão de ser. Importante é soltar as algemas que nos prendem ao que aconteceu, tornando-nos libertos, mais distantes do que fomos no passado.

Existe uma citação que diz que cada próximo nível de nossa vida, exige superação, se tornando uma nova pessoa, e às vezes é preciso que se quebrem peças, para que possamos nos reconstruir e tornarmos uma nova versão de nós mesmos.

Portanto, se você, ou alguém que amas estiver passando por momentos difíceis, espero que essas palavras possam ajuda-los.”

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Ao leitor interessado, na página do YouTube, em: BE PROUD OF YOUR SCARS, Lessons from a broken Japanese bowl, by Sean Buranahiran, pode-se ver imagens de lindas peças de louça quebrada, restauradas em filetes de ouro.  

SE ORGULLOSO DE TUS CICATRICES

Lecciones de una porcelana rota, de Sean Buranahiran

 

En la antigua cultura japonesa, cuando se rompe una vajilla de porcelana que tiene historia, o un valor sentimental, debe repararse concertándose las áreas rotas con laca mezclada con oro en polvo, creando así una nueva obra de arte que tiene como objetivo restaurar la belleza de lo que se ha roto.

Es un método único conocido como Kintsukuroi (reparación de oro), que se basa en la falsa filosofía de que las personas y los objetos no pueden tener una belleza intrínseca o que son inútiles cuando se rompen; un principio que no puede aceptarse, ya que no ofrece la oportunidad de reparaciones o dirección, tanto en la existencia de algo como en la existencia de una persona.

Se dice que los orígenes de este arte datan del período Muromachi, cuando el Shogun, Ashikaga Yoshimitsu (1358-1408) rompió su tazón de té favorito y, perturbado por el evento, lo envió a reparar en China. Pero, al devolver el objeto, quedó impresionado por las feas grapas metálicas que se habían utilizado para juntar las piezas rotas e instruyó a sus artesanos para que crearan una solución más adecuada. Lo que crearon fue un método que no disfrazó el daño, sino que convirtió su tazón en un objeto de arte.

Cuando, en sentido figurado, esta idea se transfiere a dramas y dilemas humanos, las cicatrices de heridas pueden tener diferentes formas y tamaños. Algunos son visibles en el cuerpo, otros son emocionales, invisibles, pero todavía tienen un impacto personal. Cubriendo estas heridas con el oro de la renovación, el hombre continúa su vida, en un nuevo horizonte de comprensión y aceptación. De todo lo que se ha roto, todavía queda un poco, y de lo que queda, se puede hacer lo mejor.

Este es un texto de un video que encontré “por casualidad” hace unos años y me pareció apropiado para todo el que atraviesa las dificultades de la separación, o algo que se ha roto en lo más profundo de su existencia y puede servir como recurso o reflexión para seguir adelante, dejando los grilletes del pasado, en libertad, incluso porque el pasado ya no existe en el contexto del tiempo y el espacio y no se puede rumiar esos pedazos del pasado, que más daño nos causan, y especialmente, ¡perdiendo la noción de AHORA! Sin embargo, este texto no quiere decir que alivia el dolor de la ruptura de ese algo, sino que actúa como un bálsamo, como una esperanza de fe.

A continuación, la traducción del video original y la adaptación del texto en español.

 

“Los japoneses creen que cuando algo ha sufrido daños y tiene una historia, ese daño debe repararse con oro, haciendo que el objeto sea aún más hermoso. Y la misma idea debe aplicarse a los seres humanos. Todo lo que sucedió en nuestras vidas y creó la historia, que causó daños, no debería hacer que nuestra vida sea aún más triste, sin importar lo que parezca. Depende de nosotros reparar estos daños, superarlos y recubrirlos con oro para hacer que nuestras vidas sean aún más alegres y atractivas.

Nadie está tan destruido que no pueda repararse. Podemos armar nuestras piezas, reconstruirnos y mejorar, aprendiendo de los errores del pasado.

Debemos mostrar con orgullo nuestras cicatrices, como si estas cicatrices fueran una medalla de honor, y así poder decir: “Mira por lo que pasé, me hizo quien soy hoy, que puedo superar todos los problemas que eventualmente la vida plantea ante mí.”

Aparentemente, ninguna persona vivió una vida perfecta, y tal vez nunca lo harán. Depende de nosotros, la opción de restaurarla en oro, haciéndola aún más atractiva.

No te avergüences de lo que pasó. Todo lo que sucedió tiene una razón. Entonces, cuanto más negamos nuestros errores, más nos quejamos y no aceptamos lo que sucedió, las dificultades menos útiles se vuelven para nosotros mismos. ¡El rechazo es el infierno, la aceptación es el cielo! En el momento en que aceptamos y descubrimos la utilidad de los errores, comenzamos a restaurar en oro lo que estaba roto, transformándonos a nosotros mismos y a los demás en belleza e inspiración. Todo vale la pena y tuvo su razón de ser. Es importante liberar los grilletes que nos atan a lo que sucedió, haciéndonos libres, más lejos de lo que éramos en el pasado.

Hay una cita que dice que cada próximo nivel de nuestra vida requiere superar, convertirse en una nueva persona y, a veces, es necesario romper piezas, para que podamos reconstruirnos y convertirnos en una nueva versión de nosotros mismos.

Entonces, si usted, o alguien que ama, está pasando por momentos difíciles, espero que esas palabras puedan ayudarlo”.

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Para el lector interesado, en la página de YouTube, en: BE PROUD OF YOUR SCARS, Lessons from a broken Japanese bowl, by Sean Buranahiran, se puede ver imágenes de hermosas piezas de vajilla rota, restauradas en filetes oro. 

BE PROUD OF YOUR SCARS

In ancient Japanese culture, when some porcelain tableware that has a history or a sentimental value breaks, it must be repaired by mending the areas of breakage with lacquer dusted or mixed with powdered gold, thus creating a new work of art that aims to restore the beauty of what was broken.

It is a unique method known as Kintsukuroi (golden repair), which is based on the false philosophy that people and objects cannot have intrinsic beauty or that they are useless when broken; a principle that cannot be accepted, as it does not offer the opportunity for repairs or direction, both in the existence of something and in the existence of a person.

The origins of this art are said to date from the Muromachi period, when the Shogun, Ashikaga Yoshimitsu (1358-1408) broke his favourite tea bowl and, disturbed by the event, send it to be repaired in China. But, on returning the object, he was appalled by the aesthetic metal staples that had been used to put the broken pieces together and instructed his artisans to create a more appropriate solution. What they created was a method that did not disguise the damage, but made the cup an object of art.

When in a figurative sense, this idea is transferred to human dramas and dilemmas, wound scars can have different shapes and sizes. Some are visible on the body, others are emotional, invisible, but they still have a personal impact. Covering these wounds with the gold of renewal, man continues his life, in a new horizon of comprehension and acceptance. Of everything that has broken, there is still a bit left, and of what is left, the best can be done.

This is a text from a video that I found “by chance” a few years ago and it seemed appropriate for everyone who goes through the difficulties of separation, or something that broke down in the depths of their existence and can serve as a resource or reflection to move on, leaving the shackles of the past, open free, even because the past no longer exists within the context of time and space and one cannot ruminate those bits of the past, which cause us the most harm, and mainly, making us lose the notion of NOW! However, this text does not mean that it relieves the pain of the rupture of that something, but acts as a balm, as a hope of faith.

 

“When a bowl is broken in Japan, it is put back together with the cracks being filled with gold, creating a beautiful lining. This is to emphasize the beauty of what was once broken.

They believe that when something has suffered damage and has a history, it makes it more beautiful, and the same applies to human beings. Everything that you have been through, everything that you are going through, does not make your life uglier although it may seem that way when we are going through it. It is up to us to choose to struggle or paint with gold and make it beautiful.

You are not broken beyond repair, you can pick yourself up and learn from what's happened and become a better person from it, because of the struggle that you have been through.

You can wear your scars proudly as a badge of honour as if to say look at what I have been through. It's made me who I am today, I can get through anything life puts in front of me now.

Nobody has had a perfect life and nobody ever will. It is only up to us if we choose to paint our broken pieces gold and make it beautiful.

Don't be ashamed of what happened to you. Everything that has happened to you has happened for a reason, so the more we deny, the more we complain and don't accept what's happened to us, then it does not become useful. The moment that we accept and find what's useful in the struggle the things we have been through, that's just like us painting the cracks in our broken pieces with gold, turning something that could be ugly into something beautiful and inspiring when what you have been through is an inspiration for other people then it was all worth it, so do not get stuck on how things used to be.

I once read a quote that said: “Every next level of your life will demand a new you”, and sometimes it takes being broken in order to become a new version of yourself.

So, if you are going through hard times, I hope these words can help you, or somebody that you love.”

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To the interested reader, on the YouTube page, at BE PROUD OF YOUR SCARS ... Lessons from a broken Japanese bowl, by Sean Buranahiran, you can see images of beautiful pieces of broken crockery restored in gold fillets.

O DEUS QUE TODOS NÓS TEMEMOS

Eu acredito que a educação religiosa que quase todas as crianças recebem, cria um sentimento de estranha revolta e até mesmo vingança, pois o Deus que a elas é apresentado, é um Deus maldoso, que castiga, e não um Deus de amor.

Sim, porque quando eu era um pequeno menino, alguém me disse que eu deveria temer a Deus, pois todo o homem temente a Deus é um santo. Eu pensava então que Deus era um bicho-papão perigoso e que devia ser temido.

O que me fez compreender melhor, depois de adulto, o que aconteceu com Voltaire, o pai do ateísmo, que, quando perguntado por que ele não aceitou a Deus, assim respondeu: “Não posso aceitar um Deus que eu não posso amar; o Deus que me foi apresentado deve ser temido, e como eu não posso ter medo dele, eu prefiro ignora-lo...”

Voltando aos meus tempos de infância, me lembro bem quando uma professora piedosa e sentimental estava me preparando para a minha primeira comunhão. Ela disse que eu não deveria ocultar nenhum pecado durante a confissão, porque era um sacrilégio, mas como eu não sabia o que era um sacrilégio, e, por ser uma palavra tão feia e esquisita, só poderia significar coisa ruim. E, para não cometer esse tal de sacrilégio, eu copiava do catecismo, todos os pecados contra os Dez Mandamentos, dos quais, para mim, muitos eram mortais! Bem... pecado mortal em tão pouca idade, cria um monte de confusões numa cabecinha despreparada. No momento da confissão, eu li toda a lista, incluindo os meus assassinatos e adultérios. Mas o padre confessor, vendo um menino através das grades do confessionário, não me levou muito a sério e me absolveu.

Depois, veio o tormento da primeira comunhão. A professora, sempre muito piedosa e sentimental, me alertava insistentemente e com firmeza, que eu não podia mastigar a sagrada hóstia, que era o corpo de Jesus. A única maneira era de engolir sem deixar a hóstia tocar nos dentes. Por medida de segurança adicional contra os tais possíveis sacrilégios, eu cortei, em casa, uma série de pequenas hóstias feitas com papel e as engolia uma a uma, sem morder ou tocar os dentes.

Como Voltaire, na minha infância, eu só conheci um Deus e um Cristo que deviam ser temidos, mas eu não lembro se cheguei a odiar secretamente esses bichos-papões do além...

Na infância, a percepção ainda é dos sentidos, inclusive pelo que se observa das circunstâncias externas, tanto positivas como negativas. E estar na frente do confessor, não pode deixar de ser uma violência para a sensibilidade de uma criança. Depois, mais tarde, vem a concepção intelectiva, onde muitos fogem dessas coisas do além, para mergulhar nas coisas do aquém. Mas quando, invariavelmente, desponta dentro do além íntimo de cada um, a visão intuitiva, onde os fenômenos percebidos pelos sentidos como desconexos e concebidos pelo intelecto como ligados entre si por causalidades individuais, são intuídos pela visão cósmica como regidos por uma Causa Central e única, é que desperta a real ideia de Deus e seu reino.

A única entrada legítima no reino de Deus e do conhecimento dessa dimensão, é pela porta da frente, isto é, pelo espírito de Deus, que é amor. É esse o “renascimento pelo espírito”, que confere ao homem um novo “ser”, ou seja, uma “vida” nova. O mais profano dos homens pode praticar certas técnicas físico-mentais; pode inclusive atingir o nível misterioso de uma estupenda força mágica, a ponto de deslumbrar os inexperientes e incautos. Pode o “príncipe das trevas” transformar-se em “anjo de luz”, sem por isso deixar de ser o que é intrinsecamente; porquanto ninguém é internamente transformado pelo que faz externamente, mas unicamente pelo que é internamente. O profano não deixa de ser profano pelo fato de se revestir externamente do invólucro do iniciado; a única coisa que o pode redimir da sua profanidade é a definitiva e radical abolição do seu egoísmo, e a aceitação real de um amor universal.

E assim é Deus, Amor Universal, que na intuição de Yogananda segundo a passagem da Bhagavad Gita XI, 12: “Se no firmamento se visse, de repente, a explosão de mil sóis, inundando a terra com inacreditável radiação, talvez então, fosse imaginável o esplendor e a majestade de Deus!”

Hoje, nos tempos do inverno de minha existência, essas ideologias das primaveras em flor ainda vicejam... e tarda em desabrochar uma nova mentalidade, de retirar das prateleiras os antigos, fedorentos e poeirentos manuais de catecismo, deposita-los em museus e evolucionar, e tomar a sério a ideia de Deus.

Texto revisado e em parte extraído da autobiografia de Huberto Rohden, Por Um Ideal. 

EL DIOS QUE TODOS TEMEMOS

Creo que la educación religiosa que reciben casi todos los niños crea un sentimiento de extraña revuelta e incluso venganza, porque el Dios que se les presenta es un Dios malicioso, que castiga, y no un Dios de amor.

Sí, porque cuando era niño, alguien me dijo que debía temer a Dios, porque toda persona que teme a Dios es santa. Entonces pensé que Dios era un hombre del saco peligroso y que debía ser temido.

Lo que me hizo comprender mejor, como adulto, lo que le sucedió a Voltaire, el padre del ateísmo, quien, cuando se le preguntó por qué no aceptaba a Dios, respondió: "No puedo aceptar a un Dios que no puedo amar; el Dios que me fue presentado debe ser temido, y como no puedo tenerle miedo, prefiero ignorarlo..."

Volviendo a mi infancia, recuerdo bien cuando una maestra piadosa y sentimental me estaba preparando para mi primera comunión. Ella dijo que no debía ocultar ningún pecado durante la confesión, porque era un sacrilegio, pero como no sabía qué era el sacrilegio, y porque era una palabra tan fea y rara, solo podía significar algo malo. Y, para no cometer este sacrilegio, copié del catecismo todos los pecados contra los Diez Mandamientos, de los cuales, para mí, ¡muchos eran mortales! Bueno... pecado mortal a una edad tan joven, crea mucha confusión en una cabecita no preparada. En el momento de la confesión, leí toda la lista, ¡incluidos mis asesinatos y adulterios en un probable futuro! Pero el sacerdote confesor, al ver a un niño a través de las cortinas del confesionario, no me tomó demasiado en serio y me absolvió.

Luego vino el tormento de la primera comunión. La maestra, siempre muy piadosa y sentimental, me advirtió firmemente que no podía masticar la hostia sagrada, que era el cuerpo de Jesús. La única forma era tragar sin dejar que la hostia tocara los dientes. Para mayor seguridad contra tal posible sacrilegio, corté una serie de pequeñas obleas de papel en casa y las tragué una por una, sin morder ni tocar las con los dientes.

Al igual que Voltaire, en mi infancia, solo conocía a un Dios y a un Cristo a los que debería temer, pero no recuerdo si odié en secreto a estos hombres del saco de la otra vida...

En la infancia, la percepción sigue siendo de los sentidos, incluido lo que se observa desde circunstancias externas, tanto positivas como negativas. Y estar frente al confesor, debe ser una violencia para la sensibilidad de un niño. Luego, más tarde, llega la concepción intelectual, donde muchos huyen de estas cosas del más allá, para sumergirse en las cosas de la tierra. Pero cuando, invariablemente, emerge dentro de lo íntimo más allá de cada uno, la visión intuitiva, donde los fenómenos percibidos por los sentidos como desconectados y concebidos por el intelecto como unidos por causalidades individuales, son intuidos por la visión cósmica gobernada por una Causa  Central, es que despierta la idea real de Dios y su reino.

La única entrada legítima en el reino de Dios y el conocimiento de esa dimensión, es a través de la puerta principal, es decir, por el espíritu de Dios, que es el amor. Este es el "renacimiento por el espíritu", que le da al hombre un nuevo "ser", una nueva "vida". Los hombres más profanos pueden practicar ciertas técnicas físico-mentales; incluso pueden alcanzar el misterioso nivel de una fuerza mágica estupenda, hasta el punto de deslumbrar a los inexpertos y desprevenidos. ¿Puede el “príncipe de las tinieblas” convertirse en un “ángel de luz”, sin dejar de ser lo que es intrínsecamente; porque nadie se transforma internamente por lo que hace externamente, ¿sino solo por lo que es internamente? Lo profano no deja de ser profano en la medida en que se arroja externamente sobre la carcasa del iniciado; la única cosa que puede redimir a los profanos de su blasfemia es la abolición definitiva y radical de su egoísmo, y la aceptación real del amor universal.

Y también lo es Dios, Amor Universal, quien en la intuición de Yogananda según el pasaje del Bhagavad Gita XI, 12: Si la explosión de mil soles se viera repentinamente en el firmamento, inundando la tierra con radiación increíble, tal vez sería ¡El esplendor y la majestad de Dios imaginables!

Hoy, en el invierno de mi existencia, estas ideologías de primaveras florecientes aún prosperan... y es lento para desarrollar una nueva mentalidad, para eliminar los viejos, apestosos y polvorientos manuales de catecismo, depositarlos en museos y evolucionar, y tomar en serio la idea de Dios.

Wednesday 24 February 2021

ACUMULAI PARA VÓS TESOUROS NOS CÉUS

Os objetos que costumeiramente escravizam o homem podem reduzir-se a três categorias:

1) Bens de fortuna;

2) Prazeres corporais;

3) Ambição mental.

São esses os “tesouros na terra”, que predem o homem e lhe tornam difícil ou mesmo impossível enxergar e possuir o “tesouro nos céus”, que é um “tesouro oculto”, uma “pérola preciosa”. Terra é tudo que é externo, objetivo, horizontal. Céu simboliza tudo que é interno, subjetivo, vertical.

Em última análise, o que impede o homem profano de enxergar as coisas do seu céu interior é uma estranha ignorância ou cegueira. O homem profano acha-se, de fato, num estado de sono e sonho. A sua vida é totalmente dominada por uma espécie de “sonho mental”. Julga estar acordado, em plena vigília, mas é puro engano; a sua vigília é muito incompleta, pois ele está mais dormente do que acordado já que o estado físico-mental é um estado de sono ou sonambulismo.

Quando o homem dorme profundamente, é inconsciente, não tem sonhos, e quando dorme menos profundamente, passa a ser semiconsciente, e muitas vezes tem sonhos. Esses fragmentos da sua vida sensitiva e mental passam pelo ambiente do seu semiconsciente, sem ordem nem nexo. O homem sonha como real o que é irreal. E o conteúdo dos seus sonhos continua a ser real para ele enquanto continuar nesse mesmo plano semiconsciente do sonho. Ele compra, por exemplo, um bilhete na loteria e ganha alguns milhões, a sorte grande; vai depositar a sua inesperada fortuna num banco, sai à rua – e é atropelado por um automóvel que o mata instantaneamente. Tanto aqueles milhões como essa morte são realidades para o sonhador, e só consegue sair desse mundo de ilusões, tido por real, quando acorda do seu sono e sonho. Só então verificará a irrealidade daquilo que no sonho lhe era real.

Isso quer dizer que o conceito da realidade é algo muito relativo, precário, fragmentado e variável; depende da maior ou menor consciência do sujeito, pois o conhecido está no cognoscente segundo a capacidade do cognoscente.

Depois de acordar do seu sono e sonho, esse homem sobe ao nível da consciência mental – e mais uma vez está convencido da realidade de tudo que, nesse novo nível, lhe parece como sendo real, todo esse mundo de matéria e forças; dinheiro, terrenos, casas, arranha-céus, fábricas, automóveis, prazeres, prestígio social, autoridade política, realizações científicas e técnicas – tudo isso é para o sonhador mental um mundo solidamente real, e, enquanto permanecer envolto e submerso nesse oceano de matéria e forças veiculadas pelos sentidos e pelo intelecto, ninguém o pode convencer de que está sonhando. É absolutamente certo que o mundo dos objetos e das quantidades tridimensionais não é um mundo real. Verdade é que esse mundo do tempo e do espaço também não é propriamente irreal, como pretendem certos sistemas filosóficos. Não é real nem irreal. Entre o real e o irreal há um terceiro, o realizado, quer dizer, o efeito causado por uma causa real. Esses efeitos não possuem a realidade da causa que os produziu; são apenas realizados, causados, efetuados, e, portanto, inferiores à causa causante.

Real é só Deus.

Irreal é o nada.

Realizado é tudo que a causa real realiza.

De maneira que o mundo dos objetos quantitativos, onde o homem profano localiza os seus tesouros, e de cujo material os fabrica, não é um mundo solidamente real, senão apenas precariamente realizado. E, por isso, todos os tesouros feitos desse material precário são tesouros de precária realidade, e podem desvanecer-se a qualquer instante.

Por isso, o homem sábio, o vidente da suprema e única realidade, não perde o seu tempo acumulando tesouros nessa zona incerta e com esse material duvidoso, porque sabe que esses tesouros não estão sob o seu controle, mas sujeitos às adversidades da natureza e das perversidades dos homens; sabe que a ferrugem e a traça podem destruir esses tesouros, e os ladrões podem roubar, pois o tesouro que não dependa integralmente do homem, e que possa ser destruído e roubado por fatores independentes dele, não são tesouros solidamente construídos.

Para o homem sábio, acumular tesouros dessa natureza, é o mesmo que colecionar uma infinidade de zeros, para formar um capital.

Só quando o homem descobre dentro de si mesmo a zona da realidade, isto é, a divindade de seu Eu, sua alma, é que ele começa a interessar-se por produzir tesouros de qualidade, em vez de quantidade, porque a qualidade é invulnerável e está para além de quaisquer azares da parte do mundo externo e objetivo. Nenhuma adversidade da natureza, nenhuma perversidade dos homens lhe pode roubar esse tesouro. O “reino dos céus”, onde ele acumula esses tesouros, está dentro dele; é a sua íntima essência divina.

Nesta doutrina, de que o verdadeiro Eu humano é uma realidade interna e invisível, baseia-se todo o Evangelho, como aliás toda a sabedoria dos grandes iniciados. Descobrir e viver essa realidade é firmeza, clareza, tranquilidade, paz e indestrutível felicidade. É nessa direção que convergem todas as palavras de sapiência, como estas: “Procurai em primeiro lugar o reino de Deus e sua justiça, e todas as outras coisas vos serão dadas de acréscimo.” “Maria escolheu a parte boa, que não lhe será tirada.” “Que aproveita ao homem ganhar o mundo inteiro (os objetos) se chegar a sofrer prejuízo em sua própria alma (sujeito, o seu Eu)?”

 

Texto revisado extraído do livro Assim dizia o Mestre