Sunday 28 March 2021

É JESUS O NOSSO REDENTOR?

É esta a ideia geral do povo a partir do que ensinam os teólogos: Jesus é o redentor ou salvador da humanidade.

E os fiéis perguntam: “O que se quer dizer com isso?”

Segundo os teólogos, quer dizer que o homem, desde o princípio, por obra do anticristo, caiu no pecado, herdado depois por todos os homens; que a humanidade toda é pecadora desde o nascimento, e cada homem se torna cada vez mais pecador; que o homem é um grande devedor, por herança e por atos próprios, e Deus é o grande credor. E como o devedor é totalmente insolvente, incapaz de pagar a Deus os seus débitos, a humanidade está radicalmente falida perante a justiça divina, vítima de eterna condenação.

E continuam os teólogos na sua ignorância:

De que Deus exige imperiosa e tiranicamente o pagamento da dívida que a humanidade contraiu, que Deus se sente ofendido com os pecados da humanidade e exige satisfação, e que a dívida da humanidade é de infinita gravidade!

Perguntam os fiéis mais uma vez: “Como a humanidade, falida e insolvente, poderia pagar a Deus um débito infinito?”

E lá vem os teólogos de novo:

É que Deus, não é somente justo, mas também misericordioso, teve pena da humanidade e resolveu mandar à terra seu filho unigênito para pagar os débitos dos homens. O Filho de Deus, Jesus, que se fez homem para poder, em nome de Deus, pagar os débitos da humanidade.

E isso é o que se ensina aulas de catecismos e cursos de teologia!

Paradoxal e estranho, é que o modo de pagar a Deus a dívida da humanidade foi o sofrimento e a morte de Jesus, ensinando eles que: "o seu sangue nos purifica de todos os pecados".

E assim, graças à morte de Jesus, nós somos salvos, libertos de toda a dívida de nossos pecados, reconciliados com Deus.

É esta, mais ou menos, a ideologia que vigora nas nossas teologias sobre pecado e redenção. E passados mais de 2000 anos, essa tradição se cristalizou em verdade dogmática, passivamente aceita pela cristandade.

Segundo a lógica humana, parece razoável essa ideologia, quando na realidade é inaceitável, e até monstruosa, ao ponto de Arnold Toynbee, famoso filósofo historiador inglês, ter escrito: “Se o Deus da nossa teologia existe, ele é o maior monstro do Universo”.

Antes de tudo, é um absurdo supor que uma creatura finita possa cometer uma falta de gravidade infinita. É inaceitável supor que Deus se possa sentir ofendido, quando o senso de ofensa é atributo do ego mesquinho. É repugnante a ideia de que Deus seja vingativo e não queira perdoar a suposta ofensa de pobres creaturas. É revoltante admitir que Deus tenha exigido de um homem inocente o pagamento pelo delito dos culpados. É monstruoso pensar que Deus tenha decretado o requinte das crueldades e uma morte atroz de Jesus, para se dar por quite da dívida da humanidade pecadora.

Uma nova pergunta: “Então, Jesus não é o nosso redentor?”

É, sim, mas em outro sentido, nobre, digno e perfeitamente aceitável.

Outra: “De que maneira?”

Acima de tudo, o que se entende por pecado e por redenção?

Pecado é a vitória do ego luciférico e a derrota do Eu crístico, como já vem simbolizado desde o Genesis, que fala do sibilo da serpente derrotando o sopro de Deus. Quando no primeiro homem a serpente do ego derrotou o sopro divino do Eu, o homem cometeu o primeiro pecado, porque as Leis Cósmicas exigem a vitória do Eu sobre o ego.

O pecado é uma voluntária inversão das leis eternas. Essa inversão só pode acontecer pela ilusão do ego tirânico. Mas, quando a verdade do Eu supera a ilusão desse ego, surge a redenção do homem.

Pecado e redenção são atributos da natureza humana; o homem é derrotado pelo seu ego, e é vitorioso pelo seu Eu, e, graças a seu livre arbítrio, o homem é responsável tanto por sua derrota ou pecado, como por sua vitória ou redenção. Tanto o Lúcifer como o Lógos, tanto o diabo da perdição como o Jesus da redenção, estão dentro do homem, e compete ao homem fazer triunfar o seu Eu crístico sobre o seu ego luciférico. O Lúcifer e o Cristo são os fatores do pecado e da redenção, e o homem é tanto autor disto como daquilo. É inexistente um Deus ofendido e vingativo que exija que um inocente pague pelos pecados do pecador. O ego pecador deve sofrer pela inversão das leis divinas em sua natureza humana; deve integrar-se voluntariamente no Eu Divino, e, como toda a integração do ego no Eu equivale a uma desintegração do ego, o homem não pode se redimir sem essa morte do ego – “se o grão de trigo (ego) não morrer, ficará estéril; mas, se morrer, produzirá muito fruto (Eu)”.

Em Jesus, havia plena vitória do Eu crístico sobre o ego humano – “quem de vocês pode me culpar de algum pecado?” - nunca o seu ego humano derrotou o seu Eu divino, embora o tentasse por diversas vezes, como nas trevas do Getsêmane e nos arredores do Gólgota.

Nele, a imagem e semelhança de Deus foi realizada, nele habitava toda a plenitude da Divindade. E ele afirma que ele é, para nós, o Caminho, a Verdade e a Vida. A plenitude do homem perfeito nele habita, e, como toda plenitude necessariamente transborda, “da sua plenitude todos nós recebemos, graça e mais graça”.

Como toda desintegração do ego, integrando-se no Eu, é sofrimento, Jesus mostrou nas últimas horas de sua vida terrestre, que o homem deve estar disposto a aceitar todo e qualquer sofrimento para realizar a integração do seu ego humano no seu Eu divino.

A Cristo-redenção, é uma genuína autorredenção, uma redenção do homem pelo seu Eu divino. Sem resistência não há evolução, e sem integração do ego no Eu, não há vitória.

Todo o processo do sofrimento e morte de Jesus equivale a um grandioso símbolo e a um insistente convite para o discípulo fazer o que ele fez.

Jesus é o redentor da humanidade de um modo mais verdadeiro e glorioso do que imaginam as teologias tradicionais. Redimiu plenamente o seu Jesus humano pelo poder do seu Cristo divino – “não devia então o Cristo sofrer tudo isto para assim entrar em sua gloria” - divinizou e cristificou a sua natureza humana individual, mostrando a todos o caminho a seguir, a redenção da natureza humana de cada um e sua plena auto-realização.

Jesus, pela sua auto-realização, através de seu sofrimento voluntário e vitorioso, mostra a todo homem que ele pode entrar na sua glória pelo mesmo caminho – “exemplo vos dei para que façam o que eu fiz.

Texto revisado extraído do livro Que vos Parece do Cristo? 

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