Certa vez, uns escribas e fariseus se escandalizaram com o comportamento dos discípulos de Jesus na mesa, e perguntaram a ele por que eles não observavam as tradições e comiam sem primeiro lavar as mãos. No entanto, eles não estavam se referindo a regras de higiene física, mas de impureza moral, da não observância das tradições da sinagoga.
E Jesus lhes respondeu com a seguinte comparação: "O que de fora entra no homem não o torna impuro; mas sim o que sai de dentro do homem; porque do coração é que nascem maus pensamentos, luxuria, homicídios, falsos testemunhos, hipocrisias, blasfêmias, adultérios - e são estas as coisas que tornam o homem impuro. Mas, isto de não lavar as mãos antes de comer não torna o homem impuro".
Há mais de 20 séculos que persiste junto a cristandade, a ideia de que objetos e atos externos possam dar ao homem pureza ou impureza - quando, na realidade, somente a atitude interna é que dá ao homem pureza ou impureza moral e espiritual, pois o que purifica ou contamina o homem não são as circunstâncias, mas o conteúdo de seus pensamentos.
Certas teologias eclesiásticas atribuem poder de purificação e santificação a determinados objetos e palavras – ideologia que foi herdada dos antigos "Mistérios" do paganismo romano. O pecador desejoso de purificação espiritual se dirigia aos magos e sacerdotes dos templos; tocava em determinados "objetos sacros", ou ouvia palavras rituais e se julgava purificado e redimido.
A palavra grega "Mysterion" é, em Latim, "Sacramentum". Os sacramentos eclesiásticos são a continuação dos mistérios pagãos e a sua função é de magia ritualista.
Mais tarde, prevaleceu, numa grande parte da cristandade, a magia judaica, que atribuía redenção e santificação espiritual ao sangue de animais sacrificados. Salomão, de acordo com o primeiro livro dos Reis, por ocasião da dedicação do templo em Jerusalém, mandava matar milhares de animais. A cada ano, no monte Sion, o sacerdote reunia na entrada do templo, o povo de Israel, mandava vir um bode, colocava as mãos sobre a cabeça dele e transferia para esse bode inocente os pecados do povo; depois, esse "bode expiatório" era morto, e, segundo a crença dominante, com essa morte, morriam também todos os pecados do povo.
Conta essa tradição das festas do tabernáculo que condenar à morte o bode expiatório se devia ao fato de que em rituais anteriores, soltavam o inocente animal no deserto para morrer, mas eventualmente, o bode voltava, e isso escandalizava os habitantes de Israel, pois não tinham seus pecados redimidos. Diante disso, e para que o bode não voltasse mais, era melhor matá-lo!
Conta-se também, que era costume, para diferenciar o bode que seria o expiatório, colocar uma faixa de tecido vermelho em volta do seu pescoço, mas com o calor escaldante do deserto, o sol desbotava a cor vermelha ao ponto de branqueá-la. Como o bode nem sempre morria, julgavam que a cor branca era a cor da pureza e, portanto, os pecados de Israel foram perdoados e o bode voltava a viver sem ser molestado.
A teologia cristã substituiu o bode inocente pelo único homem sem pecados e atribuiu ao sangue dele um efeito redentor e de espiritualização - embora o próprio Jesus nunca tenha considerado seu sangue como elixir de redenção!
Em algumas crenças mais recentes do cristianismo, a purificação não é atribuída a objetos e palavras, nem ao sangue de nenhum animal, mas sim ao próprio homem pecador que, através de sucessivas reencarnações, se purifica progressivamente de seus pecados.
Em todos esses casos, a pureza do homem vem de fora dele, por meio de objetos, fórmulas, rituais ou pela herança dos pais – vem sempre de um fator alheio.
Entretanto, segundo o Evangelho, não existe redenção motivada por fatores externos, mas tão somente autorredenção. O homem não é salvo por algo ou por alguém - o homem se redime, se salva, se purifica, se santifica, não pelo seu ego humano tirânico, mas sim pelo seu Eu divino, o seu Cristo interno, o Reino de Deus, a Luz do Mundo, que nele está e que ele deve fazer despertar.
Esta autorredenção é Cristo-redenção, Teo-redenção - auto-realização.
Quando Jesus responde ao doutor da lei da sinagoga que o primeiro e maior de todos os mandamentos consiste em que o homem ame o Senhor seu Deus com toda a sua alma, com toda a sua mente, com todo o seu coração e com todas as suas forças - o que é isto senão autorredenção, auto-realização? É a purificação que vem de dentro do homem, e não de fora dele. Pois, assim como, segundo as palavras de Jesus, toda impureza vem de dentro do homem, também toda a pureza vem do seu interior.
Se do seu ego humano vem a impureza, do seu Eu divino vem a pureza.
Toda a purificação e santificação do homem vem do despertamento do seu Eu divino, que é o seu "renascimento pelo espírito".
Texto extraído do livro Sabedoria das Parábolas
No comments:
Post a Comment