Thursday, 26 August 2021

A PERGUNTA DE ANANDA

O título acima faz parte de uma das inúmeras lendas do budismo indiano e que foram passadas por gerações de devotos durante os séculos em torno de sua principal figura, o príncipe Sidarta Gautama, o Buda, o Iluminado.

Devido à sua proximidade com o Buda, Ananda foi designado um dos principais discípulos além de acompanhante pessoal, seguindo-o na maioria das peregrinações como interlocutor dos diálogos com os demais, recebendo por essa devoção, o apelido de Guardião das Leis creadas pelas Potências Cósmicas.

 

Numa dessas peregrinações seguindo o Mestre, e tendo Ananda perfeita agudeza de espírito e inquiridor sobre as lutas pelo autoconhecimento e auto realização, exaustivamente ensinadas pelo Buda, faz a ele, uma pergunta:

 

--- “Mestre, o senhor é um homem muito sábio, tão desapegado e cheio de virtudes e no entanto, a vasta maioria dos homens ainda se afogam nas águas do Oceano da Mediocridade, sofrendo tanto; porque não compartilhar essa sua sabedoria afim de coloca-los acima das dores do mundo, libertando-os dos desejos?

 

E o Buda, esboçando um sorriso silencioso, responde:

 

--- Ananda, você conhece o pequeno povoado que existe aqui perto?

 

--- Sim Mestre, sei onde fica.

 

--- Pois, sendo assim, gostaria que você fosse para lá e me faça um favor.

 

--- Claro Mestre, o que quer que eu faça?

 

--- Eu preciso que você pergunte aos responsáveis de cada casa, o que mais eles desejam, e me traga as respostas.

 

E segue Ananda para cumprir o que o Mestre pediu!

 

Essa tarefa lhe custou todo um dia, recolhendo informações e pedidos esboçados por todos. E ao final da tarde, com o sol se pondo, aparece Ananda em frente do Mestre apresentando o resultado de seu trabalho.

 

--- E daí Ananda, você perguntou a todos?

 

--- Sim, Mestre. Tenho aqui em mãos o resultado.

 

--- Mestre, a vasta maioria deles pediu bens materiais que lhes permitissem ter uma vida de mais conforto com casas decentes para morar, de todos terem mais saúde, que seus filhos fossem bem casados, de terem vidas mais longa.

 

--- Mas, Ananda... pergunta Buda com um ar de apreensão? Quantos disseram que gostariam de adquirir mais sabedoria?

 

--- Não Mestre, ninguém me perguntou sobre isso!

 

--- Ananda... como você quer que eu dê alguma coisa aos homens se eles não me pedem para receber? Como posso distribuir sabedoria se nenhum deles tem esse desejo de receber esse presente?”

 

Ou seja, não basta que haja um Mestre preparado para oferecer sabedoria, é necessário que haja homens receptivos para receber. Quando alguém não tem por desejo a sabedoria, mesmo que ela se espalhe por todo o mundo, será como uma flor que por ninguém será colhida.

 

Esse mesmo conceito se aplica à ideia de alguém querer ser um filósofo, um bom filósofo, mas ninguém pode forçar alguém a ser filósofo... ou uma boa parteira, mas essa parteira jamais poderá dar à luz a uma mulher que não esteja grávida.

 

Não se pode dar à luz a algo que não se gesta, que não se espera, que não se deseja. Só mesmo depois de um longo período de incubação da sabedoria dormente no homem, é que eventualmente ela vem à luz, suposto que esse homem a deseje, a procure e enfrente os pedregosos caminhos da jornada de renunciação! 

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