Muitas vezes, o místico gosta de se isolar, apesar de viver no mundo; mas é apenas uma pausa, uma inconsciente alienação, um recarregar de baterias... e nada melhor que sair pelo mundo, conhecer novos lugares, pisar em solos onde seus pés jamais pisaram, encontrar respostas e enfrentar perguntas. Assim fez Rohden durante o ano de 1969, empreendendo uma viagem às antigas terras da Palestina, Egito e Índia, berços de tanta história.
Para que? Em busca da verdade? À procura de homens diferentes dos nossos?
Não! Os homens são fundamentalmente os mesmos, em toda parte...
Rohden viajou pelas diversidades de fora, para sentir mais intensamente sua própria unidade interior - unidade na diversidade, ou seja, a filosofia socioecológica que descreve um senso de unidade, apesar das barreiras físicas ou psicológicas.
Dessa viagem através do mundo de fora e do seu mundo interior, surgiu um livro, MINHAS VIVÊNCIAS NA PALESTINA, NO EGITO E NA ÍNDIA, cuja primeira edição se deu em 1971, livro que transporta o leitor aos mais antigos tempos de civilizações passadas e ao mesmo tempo no íntimo das idéias de um grande pensador de nossos tempos. Mas não é um guia turístico, é o relato das descobertas do mundo interior, deste vasto repertório de conhecimento alienado por circunstâncias externas que ficam dormentes e não extravasam... e nesse interior, quanta sabedoria!
“...Enquanto viajava pelos mundos, dava ordem aos mundos para viajarem através de mim, que me mostrassem o mesmo homem já conhecido mas em diferentes perspectivas.
Nunca o homem se conhece tão bem a si mesmo como quando recebe o impacto de homens alheios. A metafísica do caráter diferente dos outros catalisa e intensifica em nós a identidade própria. Cristaliza o nosso autoconhecimento.”
E foi dentro de uma caverna rochosa nas montanhas perto de Beirut, onde, enquanto saboreava o silêncio, o cri-cri-cri de uma cigarra e a algazarra de pássaros, quando ouviu o seguinte diálogo entre dois invisíveis eremitas, ambos também viajando, longe de seus domínios na Tebaida do Egito, e íntimos amigos de Santo Antão:
“--- Sabes, irmão, que lá fora há guerra? É verdade, parece que o homem só vive em guerra!
--- Guerra? Replicou o outro. Mas, o que é guerra?
--- Bem... Retrucou o primeiro: guerra... guerra... é uma coisa muito feia, que não se deve fazer.
--- Mas, afinal de contas, me explica melhor?
--- Não sei explicar... Mas vamos brincar de guerra, para entender o que é. Olha aqui, eu tenho um livro; tu não tens livro algum. Eu digo: Este livro é meu! Tu respondes: Não! Este livro é meu! Eu grito: NÃO... este livro é meu! E então começamos a tentar tirar o livro um do outro e assim começa a guerra. Entendeu? Então, vamos brincar de guerra:
Este livro é meu!...
--- ?
--- Responde!
--- Responder, o que?...
--- Grita alto: NÃO... ESTE LIVRO É MEU!
--- Como? Se esse livro é teu, então não é meu...
--- Você não entende nada mesmo!
--- Ora, ora... Tu não tens vocação para a guerra... Já acabaste com a guerra antes de começar... Os homens lá fora não fazem assim. Brigam sem fim, por causa de coisas que não são nem de um nem de outro. Morrem, e fica tudo para trás e destruído!
--- É verdade, nós não temos jeito para guerra...
--- Também não temos nada por que brigar...
--- Paciência... Não podemos nem sequer brincar de guerra...”
Texto revisado extraído do livro Minhas Vivências na Palestina, no Egito e na Índia
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