Sunday 18 July 2021

A BÍBLIA

–-- Você crê na Bíblia?

–-- Meu amigo, essa palavra “Bíblia” é muito vaga. Pode significar as coisas mais heterogêneas, e até contraditórias. Por isto, não lhe respondo nem com um sim nem com um não. Moisés, por exemplo, manda apedrejar as mulheres adúlteras (mas não manda apedrejar os homens adúlteros!) – Jesus conseguiu convencer a plebe para que Madalena não fosse apedrejada. Moisés, e o Antigo Testamento em geral, aprovam a vingança pessoal, o egoísmo sectário e nacionalista, a matança de homens, e até de pessoas inocentes – mas Jesus não aceita nada disto!

O Antigo Testamento reconhece a lei da retaliação: “olho por olho, dente por dente”; manda “amar os amigos e odiar os inimigos”; no Salmo 137:8:9, chama bem-aventurado àquele que atirar contra os rochedos os filhos dos babilônios que perseguiram e deportaram os judeus – mas nada disto é aprovado pelo Evangelho de Jesus. Ora, se ele mesmo não aceitou a Bíblia “de capa a capa”, mas apenas certas verdades eternas por ela apregoadas – como poderia um discípulo de Jesus aceitar o que ele não aceitou?

A Bíblia não é uma espécie de carta ou mensagem padronizada que Deus tenha ditado para a raça humana de todos os tempos – mas é o reflexo fragmentário de experiências que certos homens tiveram de Deus e do mundo invisível. Ora, como “o conhecido está no que conhece segundo a habilidade de quem conhece”, é óbvio portanto, que a ideia de que os diversos autores da Bíblia tinham de Deus, varia grandemente, consoante o conhecimento e a experiência de cada um. Querer nivelar todos os valores ético-espirituais da Bíblia, do Gênesis ao Apocalipse, é eminentemente absurdo. A lei da retaliação, por exemplo, era a ética mais alta que, no tempo de Moisés, era concebível – mas o Evangelho de Jesus vai muito além quando manda “amar os inimigos e fazer bem aos que nos fazem mal.”

É um absurdo querer adotar a Bíblia como regra de fé e de vida, depois da promulgação do Evangelho de Jesus; seria uma decadência e um regresso das alturas das mensagens divinas de Jesus para as baixadas das interpretações contaminadas dos homens. Mesmo os restantes livros do Novo Testamento não têm o mesmo valor ético-espiritual que encontramos no Evangelho. Todo o resto da Bíblia, tanto do Antigo como do Novo Testamento, tem que ser interpretado à luz das palavras de Jesus, como ele mesmo disse: “Eu não vim para abolir a lei e os profetas, mas para leva-los à perfeição”. É impossível se levar à perfeição o que é perfeito; logo, Jesus reconhece que as doutrinas do Antigo Testamento são imperfeitas, porque imperfeitos eram os seus receptáculos humanos, que imperfeitamente receberam e interpretaram a perfeita revelação de Deus.

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Em todos os assim chamados livros sacros de todas as religiões, credos, cultos e demais formas escritas de revelações recebidas de fontes divinas, assim que pousam em mãos humanas, sofrem imediatamente a contaminação desse elemento humano, com suas interpretações convenientes e adequados ao seu estágio de evolução espiritual. Somente o homem que viveu a experiência direta de Deus teve a habilidade de conhecer a Realidade, que chega somente depois da experiência do silêncio absoluto, da interiorização e intuição profunda; então ele irá compreender que dentro dele se encontra o verdadeiro guia. Essa intuição só se revela em sua plenitude quando o homem trabalha o conhecimento de si mesmo, que é a invasão da sabedoria cósmica no Eu. Depois desse estágio, vem a auto realização, e então todos os livros chamados sagrados, se tornarão supérfluos.

Texto revisado, extraído do livro Orientando para a Auto-realização

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